Tinto ou Branco

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Tinto ou Branco - Tânia Nogueira
Tânia Nogueira
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Restaurante goiano surpreende com carta de vinhos de Goiás

O de Pinheiros faz degustação de rótulos goianos neste fim de semana

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Já tomou os vinhos de Goiás e do Distrito Federal? Não? Então, precisa tomar. O restaurante de comida goiana Como, em Pinheiros, São Paulo, está com uma carta com diversos rótulos de Goiás, além dos rótulos internacionais. Neste fim de semana, de sexta-feira (13) a domingo (15), o restaurante vai abrir cinco dessas garrafas (no mínimo) para degustação. Por R$ 130,00, você pode provar todas e até repetir se desejar.

O cardápio comida (à parte) é composto de pratos goianos tradicionais, como a Chica Doida ou o empadão goiano, e criações da chef e proprietária Paloma Zaragoza, como o hot dog de linguiça de porco confit.

vinho e comidinhas
O Monte Alba, um branco da uva riesling itálico, foi bem com a xica doida - Tânia Nogueira/arrquivo pessoal/@tinto_ou_branco

A carta de vinhos do Cerrado do Como é separada dos outros vinhos e até bastante ampla se considerarmos que a região ainda está começando a se desenvolver. Entre tintos, brancos e rosés, eles têm onze rótulos de cinco vinícolas diferentes. Estive lá outro dia para almoçar com Paloma e provar alguns desses vinhos.

Como éramos só nós duas, ofereci para levar o Coravin que estou testando. Assim, poderíamos provar mais rótulos. O Coravin, para quem não sabe, é uma máquina que tira vinho da garrafa sem abrí-la e injeta argônio, um gás inerte, no espaço que sobra. Sem contato com o oxigênio, o vinho se mantém intacto.

Provei seis vinhos diferentes: os brancos Monte Alba, da vinícola Monte Castelo, e Reis Magos, da vinícola Serra das Galés, os rosés Sessilia, da Monte Castelo, e Cauré, da São Patrício, e os tintos Terroir Barbera, da Pireneus, e Muralha, da Serra das Galés. Veja no fim deste texto o que achei deles.

Calcula-se que o Planalto Central reúna hoje mais de 50 produtores de vinhos. Alguns deles têm apenas vinhedos e fazem seus vinhos em vinícolas de terceiros, outros têm vinhedos com instalações industriais (vinícolas). Eu acompanho essa história há um bom tempo.

Durante o Festival Gastronômico de Pirenópolis de 2010, ouvi pela primeira vez falar em vinho de Goiás e também em poda invertida. Encontrei o médico goiano Marcelo Souza e Silva no teatro da cidade apresentando uns vinhos que estava produzindo perto dali, no município de Cacoalzinho. Na época, ninguém falava em vinhos de inverno.

Marcelo foi um dos pioneiros da viticultura de inverno no Brasil. Em 2004 (quando Murillo de Albuquerque Regina, pesquisador da Epamig, ainda estava desenvolvendo o seu famoso sistema de dupla poda que permitiu a produção dos vinhos de colheita de inverno), depois de ler sobre a colheita invertida praticada em países como a Índia, Marcelo comprou um terreno de 4 hectares já pensando em montar a Pireneus Vinhos e Vinhedos.

Nessa época, até o cultivo de uvas de mesa ainda estava nos seus primórdios em Goiás. Marcelo foi o primeiro a se arriscar com a plantação de uvas vitis viníferas, aquelas próprias para a produção de vinhos finos, muito mais difíceis de cultivar. Plantou syrah, tempranillo e barbera.

Em 2008, Marcelo colheu sua primeira safra – dois anos antes da primeira safra do Primeira Estrada, o vinho da vinícola Estrada Real, de Murillo Regina, que deu início à produção dos vinhos finos no sudeste brasileiro. Na época, o médico já previa que o Planalto Central se transformaria numa região vitivinícola.

Como sempre me interesso por regiões vinícolas que começam a se desenvolver, fiz uma reportagem sobre Marcelo para o Comida, da Folha de S.Paulo, em 2014. Depois, no entanto, me esqueci um pouco dos vinhos do Cerrado.

No começo desta década, porém, pelas redes sociais, comecei a perceber que as previsões de Marcelo estavam corretas, havia uma série de vinícolas em Goiás e Brasília. Até que, em 2022, fui a Brasília visitar uma sobrinha e aproveitei para encontrar Carlos Sanabria, um enólogo gaúcho radicado na capital federal que eu conhecia por meio do Instagram.

Sanabria me levou conhecer o Vinhedo Lacustre, uma propriedade de 20 mil m² no Lago Norte com vinhedos que dão vista para a Esplanada dos Ministérios e a Praça dos Três Poderes. O projeto é uma parceria de Sanabria com o arquiteto Marcos Ritter, dono do terreno.

Depois, me pôs no seu carro e me levou para conhecer alguns dos produtores da Vinícola Brasília, que na época ainda estava em construção. Um projeto grandioso de R$ 20 milhões no cinturão verde de Brasília, dentro do DF, num assentamento dos anos 1970 conhecido como PDA-DF, que teve início em 2018 e foi oficialmente inaugurada em abril de 2024..

Com capacidade para processar 350 mil litros de vinho por safra, a Vinícola Brasília foi construída em conjunto por dez produtores de uvas (Miro Vinhos e Vinhedos, Ercoara Cordeiro e Vinho, Monte Alvor Vinhos Únicos, Marchese Vinhos e Vinhedos, Oma Sena Vinhos e Vinhedos, Horus Vinhos e Vinhedos do Planalto, Casa Vitor, Alto Cerrado Vinhos do Planalto Central, Vista Da Mata e Villa Triacca Eco Pousada e Vinhos), seis deles em fazendas do PDA-DF e quatro em fazendas da divisa do DF com Goiás. Boa parte deles trabalha com soja.

Assim como São Paulo e Minas Gerais, Goiás era considerado impróprio para o cultivo de uvas viníferas, já que tem o período de chuvas concentrado no verão, época de colheita, e a chuva traz doenças para os bagos de uva. Jogando a colheita para o inverno, que é seco e suficientemente quente, esse problema desapareceu e hoje se produz ótimos vinhos por lá.

Mulher com uma garrafa de vinho na mão
A chef Paloma Zaragoza fez questão de montar uma carta de vinhos de Goiás para harmonizar com seus pratos goianos - divulgação

No almoço com Paloma, como disse acima, provei vários deles. Começamos com o Monte Alba Sauvignon Blanc 2022 (R$ 134,00). Esse vinho foi produzido pela vinícola Monte Castelo, de Jaraguá, em Goiás, uma das vinícolas mais interessantes da região, na minha opinião. É fresco, leve e de aromas discretos (para um sauvignon blanc). Tem cítricos e frutas tropicais no nariz, mas sempre elegante. Caiu muito bem com o bolinho de costela defumada, pois corta a gordura da fritura.

Depois, passamos para o Reis Magos Riesling 2023 (R$ 125,00), da vinícola Serra das Galés, de Paraúna, Goiás. Essa vinícola foi uma das pioneiras no início dos anos 2000. Na época, trabalhava com uvas de mesa. Hoje produz vinhos finos. É um vinho bastante aromático. Aqui falamos de riesling itálico, não do riesling alemão, portanto, é esperado que tem frutas e flores em profusão no nariz. Na boca, tem ótima acidez. Foi muito bem com a bottarga que a Paloma produz na casa.

Entre um vinho e outro, Paloma me conta sua história. Neta por parte de pai do publicitário José Zaragoza, fundador da famosa agência DPZ, Paloma vem de uma família de fazendeiros de Goiás por parte de mãe. Nasceu e viveu a maior parte da sua vida em São Paulo, mas passou sempre grandes temporadas em Goiás.

Passamos, então, para o rosés. Primeiro, provamos o Cauré Syrah e Viognier 2023 (R$ 119,00), da vinícola São Patrício, de Rianápolis, Goiás. Essa vinícola é da mesma família que a Monte Castelo e, como ela, produz coisas bem interessantes. Este rosé é bastante aromático, mas elegante. Combina com a linguiça de três carnes (boi, porco e frango).

Vamos, então, para o Sessilia 2023 (R$ 134,00), da Monte Castelo. Um corte de syrah com tempranillo, é um rosé elegante. É aromático sem exageros e fresco. Tem algum corpo. Ficou interessante com o Xica Doida, algo que fica entre a pamonha salgada e a polenta cremosa, servida com linguiça.

Peço para provar o hot dog. Paloma conta que, junto com um parceiro que produz charcutaria, desenvolveu uma linguiça de porco confit. Ou seja, uma linguiça que é conservada na banha. Deliciosa.

Paloma é formada em jornalismo, mas acabou se desviando em gastronomia quando foi fazer uma pós em Barcelona. Este é seu primeiro restaurante, mas trabalha na área há um bom tempo.

Vêm os tintos. Primeiro o Muralha Sangiovese 2023 (R$ 160,00), da Serra das Galés. Um vinho com boa fruta e boa acidez, mas com aromas bem aparentes do carvalho. Deve ir bem com a vaca atolada, uma costela de boi em cama de mandioquinha. Mas confesso que não provei. Já tinha comido demais.

Depois, pedimos o Terroir Barbera 2022 (R$ 120,00), da Pireneus, a vinícola do Marcelo em Cacoalzinho. Devíamos ter tomado ele antes, pois é mais leve, mais fresco e mais frutado, mas só lembramos dele nessa hora, enfim… Veio a tempo de acompanhar, muito bem, diga-se, o hot dog. Valeu muito toda a experiência!

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