Voltaire de Souza

Crônicas da vida louca

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O capeta não descansa

Dentro da cabine de votação, eleitor pode passar por experiências inexplicáveis

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Fé. Esperança. Convicção.

O país vive momentos importantes.

Dona Idalina estava nervosa.

—O Canhoto não pode ganhar essa eleição.

Batia forte o coração daquela bolsonarista.

—Pode levar o terço na cabine de votação?

A legislação não tem nada contra.

—Vai saber. Com esses capetas comandando o TSE...

Dona Idalina acordou mais cedo do que de costume.

—Vou votar em jejum.

Para ela, tratava-se de um ato sagrado.

—Em comunhão com nosso presidente. Pela família.

Dele ou dela?

—De todos, meu filho. De todos.

Ela tinha memorizado o número de todos os candidatos.

—Queria votar no padre Kelmon para deputado... ou governador.

Quem sabe da próxima vez.

—Mas agora é Bolsonaro.

Os anéis e os dedos tremiam na hora de digitar os números na urna.

—Coisa mais complicada... só pode ser invenção do capeta.

Foi o mesário João Felipe quem notou a movimentação estranha.

—Parece que a cabine está tremendo...

Ouviram-se resmungos bizarros.

—Rrrunf... rrrunf.... arrrhum...

—Parece que esa eleitora está dando voltas... andando em círculos.

—Oiê... obadá... olorum...

Transe. Histeria. Possessão.

—Melhor chamar a segurança.

Dona Idalina parecia sapatear ao som de vigorosos atabaques.

O segurança Virgílio se aproximou da cabine.

--Tudo bem aí, minha senhora?

A imagem de Lula ainda tremulava na telinha.

—Ô meu fío... como é que dou a bênça aqui no meu Exuzinho?

Dona Idalina queria apertar o botão de Confirma.

Mas o segurança Virgílio já tinha providenciado um cobertor em cores neutras.

—A senhora está pelada... ou melhor, só de calcinha vermelha e preta...

A anciã resistiu com força sobrenatural às tentativas de disciplinar seu comportamento.

—Sou pomba-gira... sou pomba-gira.

Anos de abstinência sexual se exprimiram num beijo impulsivo.

—Vem cá. Meu guardinha.

João Felipe achou melhor suspender a votação.

—Motivo de força maior.

O voto deve ser consciente.

Mas, por vezes, a democracia é sobretudo um estado de espírito.

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