Filhos. Crianças. Bebês.
A humanidade atinge mais um marco notável.
Oito bilhões de pessoas no planeta.
Nonô Silveirinha era um poderoso agricultor.
—Está vendo? É o que eu sempre digo.
A filha dele se chamava Rosana.
—Diz o quê, pai?
—Como é que vocês querem alimentar essa gentarada toda?
Eram fortes as suas convicções bolsonaristas.
—Só derrubando árvore, pô.
Rosana procurava se informar sobre ecologia.
—Mas aí, pai...
—Aí o quê? Hein, hein?
—Dizem que com tanta gente a terra esquenta muito.
—Bobagem, Rosana. Invenção de quem não tem nada o que fazer.
—Parece que aí o mar vai subir e ocupar a terra.
—Quem disse isso, filha?
Rosana tinha ouvido alguma coisa no culto evangélico.
—Não tem esse perigo não, filha. Pode se acalmar.
Joca se muniu de paciência.
—Vou te explicar. Primeiro.
—Hã.
—Está comprovado que a terra é plana.
—E daí?
—Se a água começar a subir...
—O que é que tem?
—Escorre tudo pela borda, Rosana. Lógico.
A filha ficou pensando.
—Vou ter de conversar com o pastor...
—Ele certamente não está bem informado.
—Mas e o dilúvio? Aconteceu, né.
Joca sorriu com superioridade.
—Então. Encheu, encheu... depois, esvaziou.
Rosana ainda não estava convencida.
—Mesmo assim, pai, essa gente toda...
--Qual o problema, minha filha? Vai dizer que é a favor do aborto.
—Nããão... é que...
—Fala, coração.
—É muita população do lado de lá. China, Índia, Áustria...
—E daí?
—Olha, pai. A terra é plana, certo?
—Certo.
—Com tanto peso do lado de lá, vai balançar para aquele lado. A terra vai ficar bamba de um lado só.
Joca sorriu novamente.
—Ué, melhor ainda, meu amor.
—Verdade, paí?
—Derruba metade dessa gente para fora da borda, pô.
—E aí tudo equilibra novamente?
—Claro.
Ele respirou fundo.
—Deus sabia o que estava fazendo, Rosana.
—Verdade, pai.
O agricultor colocou a mão carinhosamente no ombro da filha.
—Depois, se ainda tiver qualquer problema com esses oito bilhões...
—O que que a gente faz, pai?
—Pede recontagem, ué.
As notícias podem não ser boas para o pensamento conservador.
Mas, em águas tempestuosas, é preciso sempre um otimista para tocar o barco.
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