Preconceito. Fanatismo. Discriminação.
Para muitas pessoas, a Fifa errou ao realizar a Copa no Qatar.
Aslan não se importava.
—Muçulmano, católico, crente... tudo é a mesma coisa.
Ele abria a primeira lata de cerveja.
—Minha religião é o futebol.
Estava tudo pronto para o jogo naquele amplo apartamento do Tatuapé.
—Comprei até uma TV nova.
Tela plana. Alta definição. Áudio surround.
—Vem até com a Alexa.
O rapaz se esticou na poltrona de curvim.
—Oi, meu bem.
A mulher dele se chamava Rejane.
—Me chamou, Aslan?
—Não, não. Estou falando aqui com a Alexa.
—Ah.
—Não vai ficar com ciúme, hein? Hahaha.
—Ai, Aslan. Me poupe.
—E a pipoca? Já ficou pronta?
Rejane apareceu com a tigela.
—Pô, Rejane... sem manteiga?
—Pois é, Aslan. Você esqueceu do seu colesterol?
O jogo do Brasil estava começando.
—Caceta, Rejane. Você não dá um minuto de folga.
—Quer que eu faça outra?
Aslan já estava concentrado nos primeiros lances.
—Pxit. Quieta. Vê se não atrapalha.
Uma sombra de mágoa passou pelo coração de Rejane.
Ela se retirou silenciosamente para a cozinha.
Em poucos minutos, a pipoca amanteigada estava pronta.
Rejane passou pela frente de Aslan para pegar a tigela e substituir o quitute.
—Sai da frente, pô. Bola na área.
Rejane foi de volta para a cozinha com a leveza de uma fada.
Havia um sorriso no seu rosto quando ela voltou com a pipoca nova.
—Pronto, Aslan. Como você queria.
O marido perdeu a paciência.
—Mas você não para quieta?
—Puxa, Aslan...
—Deixa eu assistir o jogo e para de encher, pô.
Ele não reparou quando Rejane saiu do apartamento.
Duas malas. Uma mochila. E a bolsa de mão da academia.
—Aqui não fico mais.
Ela ainda não se decidiu para onde vai.
—Acho que até no Qatar me tratam com mais respeito.
A opinião é polêmica.
Lá, as mulheres são obrigadas a usar véu.
Mas muitos véus invisíveis, por vezes, cobrem os olhos de quem vê a Copa.
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