Dinamarca vai abater milhões de animais por temor de mutação de coronavírus

OMS foi notificada, mas cientistas pedem cautela, já que o novo coronavírus tolera um número limitado de modificações em seu material genético

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James Gorman
The New York Times

O governo da Dinamarca vai abater milhões de visons em mais de mil fazendas de criação por causa do temor de que uma mutação no novo coronavírus que infectou os animais possa prejudicar a eficácia de uma vacina em seres humanos.

Existem 15 milhões ou mais de visons na Dinamarca, que é um dos maiores exportadores de peles do animal (também conhecido como mink). O abate de todos os animais eliminará essa indústria, talvez durante anos.

A primeira-ministra Mette Frederiksen disse que as Forças Armadas vão participar do abate dos animais.

O governo notificou a OMS (Organização Mundial de Saúde) sobre a mutação do vírus e afirmou que 12 pessoas na região de Jutland estão infectadas. A OMS afirmou por email que foi "informada pela Dinamarca sobre um número de pessoas infectadas por coronavírus por visons, com algumas mutações genéticas no vírus". A entidade disse que a Dinamarca está "investigando a importância epidemiológica e virológica dessas descobertas e abatendo a população de visons". "Estamos em contato com eles para saber mais sobre esse fato", disse a OMS.

Sem relatórios publicados sobre a natureza da mutação ou como a variante do vírus foi testada, pesquisadores fora da Dinamarca que estudam o vírus ficaram no escuro. Stanley Perlman, microbiólogo na Universidade de Iowa e especialista no novo coronavírus, disse que não poderia avaliar as declarações da Dinamarca sem mais informações.

Jonathan Epstein, vice-presidente de ciência e comunicação na organização ecológica EcoHealth Alliance, disse que não tinha visto detalhes até agora, mas "alguém terá de divulgar as sequências em breve, e os biólogos as examinarão".

Em rede social, Emma Hodcroft, geneticista na Universidade de Basel, na Suíça, que está acompanhando a disseminação do novo coronavírus, pediu cautela. "Não entrem em pânico. Os cientistas vão nos atualizar quando tivermos mais informação."

De acordo com o que escreveu o infectologista brasileiro Esper Kallás, o novo coronavírus tolera número limitado de modificações em seu material genético. Mudanças maiores na coordenação da multiplicação geram erros que impedem que complete seu ciclo. E é isso o que parece ocorrer com o Sars-CoV-2. A maioria das mutações que ocorrem na sua evolução é mínima e não altera a estrutura do vírus, enquanto a maior parte do material genético serve para controlar a sua multiplicação.

Não é possível prever a transmissibilidade do novo coronavírus e nem de outros vírus baseando-se apenas na sequência genética. Somente a observação de sua transmissão entre as pessoas será capaz de elucidar essa informação. E, até agora, o padrão tem sido mantido.

Pesquisadores estudaram uma mutação rotulada de D614G no espinho da proteína do vírus que poderia aumentar a transmissão. Eles concluíram que não há evidência de que essa mutação em particular aumente a virulência ou possa afetar a ação de uma vacina.

Em setembro, cientistas holandeses relataram em um trabalho ainda não avaliado por pares que o vírus estava passando de visons para humanos. Na Dinamarca, o governo descreveu uma versão do vírus que migrou de visons para humanos.

Os visons são da família mustelídeos, juntamente com os furões, que são facilmente infectados com o coronavírus. Os furões parecem sofrer sintomas leves. Já os visons, que são mantidos em condições de superlotação ideais para a disseminação de um vírus, podem adoecer e morrer.

Esses bichos foram infectados em outros países também, como a Holanda e em alguns estados dos EUA. Milhares de visons foram mortos em Utah por causa de um surto de coronavírus, mas as autoridades disseram que não parecia que eles transmitissem a doença para humanos, e sim o contrário.

Muitos cientistas ligados à conservação da natureza ficaram preocupados com a disseminação do vírus para populações animais, como chimpanzés, que seriam suscetíveis, embora não haja casos identificados até agora. Grupos de pesquisadores estão fazendo testes com animais domésticos e silvestres nos Estados Unidos.

Cientistas também estão preocupados sobre o que acontece quando o vírus passa de uma espécie para outra e pode sofrer mutações. Enquanto a maioria dessas mutações provavelmente não representará problemas para os humanos, há sempre a possibilidade de que variantes do vírus possam se tornar mais infecciosas ou mais virulentas.

O grupo de ativistas Animal Protection Denmark recomendou uma solução em longo prazo para o problema dos visons e do coronavírus: "A decisão certa seria eliminar a criação de minks totalmente e ajudar os agricultores em outra ocupação que não ameace a saúde pública e o bem-estar dos animais."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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