Ilha perto da Antártida pode ser a resposta para enigma sobre Marte

Pesquisadores dizem acreditar que Deception tem características similares ao planeta vermelho

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Juan Restrepo Juan Barreto
Ilha Deception (Antártida) | AFP

Uma ilha vulcânica com forma de ferradura perto da Antártida pode ser a resposta para o enigma sobre Marte. Com um passado de fogo ainda latente, a remota Ilha Deception dá pistas aos pesquisadores sobre a vida extraterrestre.

Peixes, krills, anêmonas e esponjas marinhas subsistem em um ecossistema de contrastes extremos ancorado no Estreito de Brandsfield, a cerca de 420 km de Puerto Williams, no Chile.

Há milhares de anos, o vulcão coberto de neve entra em erupção. Os mais recentes, em 1967, 1969 e 1970, arrasaram as bases antárticas britânica e chilena e forçaram a evacuação da instalação argentina na ilha. Com o passar do tempo, porém, a vida renasceu.

Pessoas na beira do mar
Turistas visitam os restos da Companhia Baleeira Hector na Baía do Baleeiro, na Ilha Deception, na península oeste da Antártida - Juan Barreto - 24.jan.2024/AFP

Os pesquisadores estão convencidos de que esse lugar, onde pinguins, focas e leões-marinhos nadam livremente, tem características similares às de Marte.

O estudo dos micro-organismos ali presentes, capazes de suportar temperaturas extremas de até -28°C, pode ser um guia para a possibilidade de existência além da nossa atmosfera.

"É análoga à de Marte porque [lá] o que temos é um planeta com [um passado de] imensa atividade vulcânica e que, atualmente, há condições muito frias", disse à AFP o geólogo planetário espanhol Miguel De Pablo.

A análise das rochas da ilha complementa o trabalho de engenheiros, cientistas e astrônomos que já escavam e sobrevoam Marte com robôs.

"É a melhor aproximação possível que podemos fazer para compreender Marte sem pisar" nesse planeta a cerca de 225 milhões de quilômetros da Terra, acrescenta De Pablo, professor da Universidade de Alcalá e chefe da rede de monitoramento de solos congelados da Antártida.

Terra de pesquisa

As ruínas das antigas bases científicas enferrujam na Ilha Deception, um território de 89,5 km2 se somarmos as pequenas ilhotas ao seu redor que emergem no oceano antártico. Um canal permite a passagem de água para a antiga caldeira, onde ainda existem fontes termais.

Musgos e líquenes únicos crescem na superfície. Milhares de pássaros também fazem ninhos, segundo a Universidade Nacional da Colômbia, que estudou sua semelhança com Marte.

Para Wilson Andrés Ríos, capitão de fragata da Marinha colombiana e pesquisador, as mudanças que Deception e o restante da Antártida experimentaram são explicadas pela "evolução da intervenção humana".

No início do século passado, a ilha testemunhou uma "caça indiscriminada" de focas e baleias, afirma Ríos, um dos tripulantes da X Expedição Científica, um projeto oficial que navega desde o final de 2023 nas águas desde a caribenha Cartagena até esse confim do planeta a bordo do navio ARC Simón Bolívar.

Em 1931, uma fábrica de processamento de óleo de baleia instalada por noruegueses fechou e, em 1944, a ilha começou a ser sede de uma base científica do Reino Unido, que ali chegou após uma expedição lançada durante a Segunda Guerra Mundial para ocupar territórios antárticos, batizada como Operação Tabarín.

Pela vida

Vários despejos e erupções depois, a Ilha Deception foi declarada uma terra de paz e pesquisa.

Sob o olhar preocupado dos pesquisadores com possíveis interferências em seu trabalho, milhares de turistas também chegam em cruzeiros, um fenômeno "em aumento preocupante", afirma a historiadora e mestre em geografia Natalia Jaramillo, coordenadora científica da expedição.

Embora existam temperaturas muito mais baixas em Marte, de até -153°C, segundo a Nasa, a agência espacial americana), De Pablo está convencido da contribuição para a ciência e para uma humanidade que olha para o espaço exterior.

Em 2023, pesquisadores da Nasa concluíram que Marte teve, em algum momento, um clima com estações cíclicas, propício para o desenvolvimento da vida, de acordo com deduções a partir de evidências encontradas no planeta vermelho pelo robô explorador Curiosity.

Além disso, apoiam a hipótese de que uma imensa erupção vulcânica mudou sua atmosfera e propiciou o aparecimento de oceanos e rios que depois evaporaram.

"As condições antárticas podem nos ajudar a entender se, em Marte, podem acontecer, ou podem ter acontecido as condições para o desenvolvimento da vida", trata-se de "entender como a vida se adapta às condições tão extremas geradas tanto pela atividade vulcânica quanto pelo frio", diz De Pablo.

"Não temos 100% de certeza (dos resultados), mas é uma forma de ir limitando aquelas coisas que podem acontecer, ou descartar outras", conclui.

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