Descrição de chapéu The New York Times

Estudo sobre suposta pirâmide mais antiga do mundo tem erro

Autores dataram incorretamente a presença humana em Gunung Padang, na Indonésia

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Mike Ives
The New York Times

Um estudo que desafiou a ortodoxia científica ao afirmar que o sítio arqueológico Gunung Padang, na Indonésia, seria a pirâmide mais antiga do mundo foi retratado.

O trabalho em questão saiu em outubro do ano passado na revista Archaeological Prospection. Nele, defendeu-se que a camada mais profunda do sítio parece ter sido esculpida por humanos até 27 mil anos atrás.

Críticos disseram, porém, que os autores dataram incorretamente a presença humana em Gunung Padang ao se basearem em medições de radiocarbono do solo de amostras de perfuração em vez de recorrerem a artefatos.

O sítio arqueológico Gunung Padang fica no topo de uma colina, na Indonésia, e há muito tempo tem atraído visitantes cujo objetivo é realizar rituais islâmicos e hindus - Adelukmanulhakim/Adobe Stock

A Wiley, editora americana da revista, citou esse motivo no aviso de retratação feito nesta segunda (19).

Gunung Padang é considerado um vulcão adormecido, e arqueólogos afirmam que as cerâmicas recuperadas até agora sugerem que os humanos têm utilizado o local por centenas de anos ou mais, mas nada que alcance 27 mil anos.

Para se ter uma ideia, as pirâmides de Gizé, no Egito, têm cerca de 4.500 anos.

Na retratação, baseada em uma investigação de vários meses, é dito que o estudo contém falhas porque suas amostras de solo "não estavam associadas a quaisquer artefatos ou características que pudessem ser interpretadas de forma confiável como antropogênicas ou 'feitas pelo homem'".

Alguns arqueólogos avaliaram como positiva a retratação.

Já os autores do estudo a chamaram de injusta. Para eles, as amostras de solo foram "inequivocamente estabelecidas como construções feitas pelo homem ou características arqueológicas", em parte porque as camadas de solo incluíam artefatos.

"Encorajamos a comunidade acadêmica, organizações científicas e indivíduos preocupados [com o tema] a se unirem a nós para desafiar essa decisão e defender os princípios de integridade, transparência e justiça na pesquisa científica e publicação", escreveram os autores.

O autor principal do estudo, o geólogo de terremotos Danny Hilman Natawidjaja, não atendeu a um pedido de entrevista, assim como a Wiley e os editores de Archaeological Prospection, Eileen Ernenwein e Gregory Tsokas.

Apoiador da pesquisa de Natawidjaja, o jornalista Graham Hancock disse em um comunicado que não vê a retratação como "justa, justificada ou boa ciência". A seu ver, em vez de emitir uma retratação, o jornal deveria ter publicado críticas ao artigo, uma medida que, ainda de acordo com ele, teria permitido aos leitores formarem suas próprias opiniões.

"A ciência não deve ser sobre supressão", disse Hancock, que entrevistou Natawidjaja para um episódio sobre Gunung Padang em "Ancient Apocalypse", sua série documental da Netflix de 2022.

A Society for American Archaeology afirmou que o programa da Netflix de Hancock "desvaloriza a profissão arqueológica com base em alegações falsas e desinformação".

Hancock, por sua vez, rejeitou esse argumento. Ele disse que os arqueólogos deveriam ser mais abertos a teorias que desafiam a ortodoxia acadêmica. A Netflix não respondeu a um pedido de entrevista sobre a retratação.

Gunung Padang fica no topo de uma colina pontilhado de terraços de pedra e, há muito tempo, tem atraído visitantes cujo objetivo é realizar rituais islâmicos e hindus

A tese de que seria uma pirâmide antiga teve apoio e financiamento do governo central durante a administração Susilo Bambang Yudhoyono, que deixou o cargo em 2014. Seu sucessor, Joko Widodo, cortou o financiamento.

Um dos arqueólogos que receberam bem a retratação, Noel Hidalgo Tan disse que a considerou totalmente apropriada porque as evidências do estudo não sustentavam suas conclusões.

"Foi lamentável que o artigo tenha chegado a essa etapa", afirmou Tan, que trabalha no Centro Regional do Sudeste Asiático para Arqueologia e Belas Artes. "Mas foi melhor ser retratado do que não ter nada dito sobre isso."

Dwi Ratna Nurhajarini, chefe do Escritório de Conservação do Patrimônio Cultural na província de Java Ocidental, onde está localizado o sítio arqueológico, disse que as conclusões do estudo devem ser reexaminadas à luz da retratação.

"As estruturas em Gunung Padang são de fato em camadas e em terraços, lembrando civilizações do passado distante da Indonésia", afirmou ela por telefone. "Mas sua idade pode não ser tão antiga quanto o sugerido."

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