Prefeitura investiga se rede de porões pode ser maior cidade subterrânea da Turquia

Área equivale a 83 campos de futebol e serviria de abrigo contra inimigos e predadores

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Anne Chaon
Midyat (Turquia) | AFP

Sob as casas de pedra da cidade de Midyat, na província de Mardin, sudeste da Turquia, funcionários da prefeitura escavam e restauram uma ampla rede de porões do que pode ser a maior cidade subterrânea do país.

Até agora, eles limparam meia centena de salas, conectadas por um túnel de 120 metros de comprimento, algumas com desenhos enigmáticos nas paredes: um cavalo, estrelas de oito pontas, árvores, a mão de um adulto.

"Inspecionamos mais de 8.200 m² de um total estimado de 900 mil m² [o equivalente a 83 campos de futebol], o que faria dessa rede a maior cidade subterrânea da Anatólia, talvez do mundo", afirma Mervan Yavuz, responsável pela conservação de Midyat.

A imagem mostra o interior de uma caverna com formações rochosas. À esquerda, há uma parede de pedra clara com um buraco circular. À direita, uma área mais ampla da caverna, onde uma pessoa está agachada, vestindo roupas coloridas. A iluminação na caverna é variada, com tons de roxo e amarelo, destacando as texturas das rochas.
Funcionários municipais trabalham dentro do sítio arqueológico de Matiate, sob a cidade de Midyat, na província de Mardin, no sudeste da Turquia, em julho de 2024 - Yasin Akgul/AFP

Os trabalhos começaram em junho de 2020, quase por acaso. Operários municipais limpavam os porões dos quartos quando encontraram uma porta de madeira azul que dava acesso a um túnel estreito, com menos de 1,70 metros de altura.

"Para se proteger do clima, dos inimigos, dos predadores e das doenças, as pessoas buscaram refúgio nos porões até fazer uma verdadeira cidade", afirma Yavuz.

A entrada inicial era formada por uma abertura redonda sob a qual era preciso se agachar para passar.

"De fato, suspeitávamos de sua existência: o chão afundou e uma máquina de construção caiu nos anos 1970. Mas então não procuramos saber mais, apenas reforçamos e fechamos", diz ele.

Cultos proibidos

Midyat fica bem perto da Síria, às portas da antiga Mesopotâmia, em uma região antes cobiçada e ocupada por grandes impérios.

"Pagãos, judeus, cristãos, muçulmanos... Todos contribuíram para a cidade subterrânea de Matiate", conta Yavuz usando o antigo nome de Midyat, que já aparece no primeiro milênio antes de Cristo em uma estela que relata sua conquista pelos assírios.

Entrando no túnel, Yavuz termina em uma sala com o chão cavado em pedra calcária, no meio da qual há uma laje que pode ter sido utilizada para celebrações ou sacrifícios.

Nas paredes ainda se veem as marcas das ferramentas usadas para abrir caminhos na rocha.

"Como o lugar foi ocupado ininterruptamente, é difícil atribuir sua origem", diz Yavuz, que sugere que judeus e cristãos encontraram ali a possibilidade de praticar seus cultos proibidos.

"Antes da chegada dos árabes, essas terras eram duramente disputadas pelos assírios, persas, romanos e depois pelos bizantinos", afirma Ekrem Akman, historiador da Universidade Mardin Artuklu.

"Os cristãos da região começaram a construir desde os séculos 5 e 6 muitos mosteiros fortificados", acrescenta ele.

Atração turística

Terminadas as invasões, os porões continuaram sendo úteis, diz Gani Tarkan, ex-diretor do museu de Mardin, que recuperou numerosos objetos cotidianos, peças de bronze e cerâmicas dessa rede subterrânea.

"Mesmo quando os ataques terminaram, quando o cristianismo se tornou a religião oficial [do Império Bizantino], as pessoas continuaram usando esse lugar como espaço de vida", afirma.

"Algumas salas serviram como catacumbas, outras como celeiros."

Lá foram encontrados esqueletos, mas também restos de animais e produtos agrícolas armazenados nos tempos do posterior Império Otomano.

Longe do radiante sol da superfície, na fresca escuridão dos porões, Yavuz aponta três grandes buracos redondos escavados para colocar ânforas de vinho produzido nas colinas circundantes, ainda uma especialidade dos cristãos da região.

Ao contrário das cidades subterrâneas verticais da região turca da Capadócia, construídas por andares na profundidade da pedra, a de Midyat se estende horizontalmente, segundo Tarkan.

A Prefeitura de Midyat, que financia integralmente os trabalhos de exploração, espera que com projeto possa atrair turistas para a cidade de 120 mil habitantes.

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