Na Copa de 1970, a pretensão de torcer contra o Brasil acabou quando Pelé, ainda no primeiro tempo da partida de estreia com a Tchecoslováquia, chutou a bola antes do meio de campo para surpreender o goleiro Viktor, adiantado, e ela, caprichosamente, passou rente à trave. A partir dali, aqueles que se opunham à ditadura militar, e não queriam que o regime linha-dura do general Médici lucrasse politicamente com a conquista no México, renderam-se aos craques. Hoje também se torce contra a seleção, e não há mais Pelés, Gérsons, Tostões.
Talvez não seja bem torcida, mas rejeição ou indiferença. Tirando momentos luminosos de Romário, Rivaldo, os dois Ronaldos, desde a Copa de 1982, na Espanha, não existe “aquela” identificação entre time e povo. Vibra-se mais pelo clube do coração do que pela seleção cujos jogadores tatuados e careteiros fizeram suas vidas atuando no exterior. O advento de um Cebolinha, que só por milagre não foi negociado, causa espanto. Ao chegar ao país, convocado para a Copa América, Filipe Luís disse que preferiria disputar a Eurocopa, “um torneio que tem mais glamour”. Ninguém estranhou.
Com o alto preço dos ingressos nas chamadas arenas, a galera sem grana abrigou-se nos botequins mais vagabundos, diante da TV. Nem queira ouvir os xingamentos com que eles tratam a seleção que um dia os representou.
Para piorar, a camisa canarinho foi sequestrada. Virou elemento de decoração para manifestações patrioteiras. Em sua obsessão de “mito”, o presidente Bolsonaro não perde a chance de se pavonear à beira dos gramados, recolhendo aplausos mas também apupos. Pense num homem errado num lugar errado.
Neste domingo (7), o time do Brasil, depois de seis longos anos, reencontra o Maracanã, seu maior palco, para a decisão com o Peru. Se não se pode ter uma seleção de sonhos, ao menos que o estádio volte a habitar o imaginário da bola.
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