Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Day traders ganham em mais de 50% dos dias, mas perdem dinheiro em média

Situação faz lembrar o 7 a 1 da Alemanha sobre o Brasil em 2014

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Brasil e Alemanha jogaram no estádio Mineirão pela semifinal da Copa do Mundo de 2014. Os últimos 15 minutos do jogo foram vencidos pelo Brasil, por 1 a 0, com gol de Oscar no finalzinho.

Isso é verdade. Assim como é verdade que a Alemanha ganhou de 7 a 1 e é difícil esquecer a seleção brasileira paralisada ao tomar mais um gol na sacola quando o placar mostrava 4 ou 5 a zero para os visitantes.

Alemães comemoram o sexto gol no Mineirão - Eduardo Knapp - 8.jul.14/Folhapress

Essa analogia me veio à mente quando procurei estatísticas de day-trade de pessoas físicas no site da B3, a Bolsa de São Paulo.

Pesquisadores já mostraram que o resultado de operações de day trade de pessoas físicas é um verdadeiro 7 a 1 contra os que se aventuram por esse caminho. Praticamente todo mundo perde.

O site da B3, porém, mostra que os day traders ganham na maior parte dos dias em que operam. Além disso, no caso de ações (mas não de futuros), os ganhos medianos são maiores que as perdas medianas. Será que na verdade day trade é uma atividade lucrativa para muitos?

Não é. As informações do site da B3 são tão verdadeiras quanto a afirmação de que o Brasil ganhou de 1 a 0 os últimos 15 minutos do jogo contra a Alemanha. Mas é interessante entender o que está por trás dessas estatísticas.

Por que day traders parecem ganhar com mais frequência do que perdem mas ao mesmo tempo perdem dinheiro com day trade?

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Estátua em frente à sede da Bolsa em São Paulo - Danilo Verpa - 17.nov.21/Folhapress

A raiz da explicação está no que chamamos de "efeito disposição": quando compramos uma ação e o preço sobe, queremos vender rapidamente e colocar os lucros no bolso; mas quando o preço cai, nossa tendência é segurar e torcer para o preço subir.

Por isso, dados de day trade de ações têm um viés: quem compra uma ação tem mais chance de vender no mesmo dia se o preço subiu. Quem perderia dinheiro se fizesse day trade tende a deixar para vender depois.

A maior parte do day trade de pessoas físicas está nos contratos futuros, os chamados mini-índice e mini-dólar. Nesses casos, o problema acima não aparece porque as pessoas tipicamente realizam as perdas e os ganhos no mesmo dia (porque operam com dinheiro emprestado e não podem carregar a posição para o dia seguinte).

Nesses contratos futuros, as pessoas também ganham em mais de 50% dos dias. Contudo, as perdas são em geral bem maiores que os ganhos.

De novo, isso é explicado pelo "efeito disposição": quando estão ganhando, day traders tendem a reduzir seus riscos e saborear um dia de ganhos. Quando estão perdendo, eles tendem a dobrar as apostas, o que pode levar a um resultado positivo, mas também pode gerar perdas maiores.

Nesse jogo, em que a "cara" gera um ganho de $ 1 e a "coroa" leva a uma perda de $ 2, ganhar em mais de 50% dos dias não é suficiente.

A parte mais interessante é que esse "efeito disposição" pode ajudar a explicar por que tantos day traders persistem numa atividade fadada ao fracasso.

Em pesquisa recente, Fernando Chague, Bruno Giovannetti, Bernardo Maciel e eu mostramos que day traders decidem se continuam ou param de operar baseando-se simplesmente na quantidade de dias que eles ganham ou perdem, não em quanto dinheiro eles ganham ou perdem no total.

O problema é que, por conta do "efeito disposição", eles ganham em mais de 50% dos dias, apesar de perderem dinheiro em média (porque as perdas são maiores que os ganhos).

Assim, eles continuam persistindo, como se os ganhos de $ 1 cancelassem as perdas de $ 2.

Qualquer trabalho bem executado mostra que o resultado financeiro para day traders é uma derrota de 7 a 1. É uma pena que na discussão desse assunto tanta gente foque no gol do Oscar.

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