Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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BNDES e crédito privado: complementos ou substitutos?

Experiência recente é coerente com a tese de que crédito do BNDES e privado são substitutos

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Nas discussões sobre o BNDES, uma questão importante e bastante debatida é: o BNDES complementa ou substitui crédito privado? Se o BNDES expande seu crédito, o que acontece com empréstimos de bancos e mercados de capitais?

Quem argumenta que mais crédito do BNDES leva a mais crédito privado frequentemente aponta para as diferenças nas características desses tipos de empréstimo. Por exemplo, operações de longuíssimo prazo são mais raras no setor privado; muito do financiamento privado se destina a capital de giro; alguns tipos de empresa recebem mais crédito do BNDES.

Como as empresas precisam de diferentes tipos de financiamento, pode de fato parecer que instituições financeiras especializadas em formas de crédito distintas se complementariam. Mais crédito de um tipo levaria a mais crédito do outro. Assim, o BNDES aumentaria o nível de investimento na economia.

O grande problema com esse argumento é que o dinheiro para crédito precisa vir de algum lugar: ou de superávit das contas públicas, ou de fluxos de capital estrangeiro, ou da parte da renda das famílias que foi poupada. A soma disso tudo é o que há para ser investido na economia.

Esse total reage pouco, pelo menos a curto prazo, a mudanças no direcionamento do crédito. A implicação importante é que o total investido não pode variar muito com a atuação do BNDES. Mais investimento fomentado pelo BNDES tira espaço para investimento privado.

Já toquei nesse ponto no passado, hoje vou falar sobre os dados do mercado de crédito.

A partir do fim de 2016, com o impeachment e a mudança de governo, há uma mudança na forma de atuação do BNDES. Os desembolsos do BNDES a partir de 2017 são inferiores à metade dos desembolsos do banco durante o governo de Dilma Rousseff.

Se crédito do BNDES e crédito privado são substitutos, essa mudança deveria levar a um aumento no crédito privado que compensaria a redução dos empréstimos do BNDES. Isso é de fato o que observamos.

Em 2016, o mercado de capitais doméstico equivalia a cerca 2% do PIB. Como mostrou Cecilia Machado em coluna na Folha, esse percentual cresceu drasticamente desde então, chegando ao redor de 6% do PIB.

Com menos crédito do BNDES, empresas passaram a captar mais emitindo títulos no mercado.

Defensores da atuação do BNDES apontam que esse mercado de capitais é acessado por grandes companhias, uma fração pequena das empresas que tomam crédito no país (de bancos e do BNDES). Isso é verdade.

Mas podemos argumentar a partir daí que essa redução na atuação do BNDES pode ter piorado o acesso ao crédito a pequenas firmas?

Se grandes empresas tomam mais crédito pelos mercados de capitais, elas pegam menos emprestado dos bancos. De fato, em 2017, grandes companhias representavam mais de 50% da carteira de crédito livre a pessoas jurídicas. Hoje, esse percentual está em cerca de 40%.

A contrapartida é que a fração do crédito bancário direcionado a empresas de pequeno porte aumentou muito (cerca de dez pontos percentuais).

Então, a redução do BNDES de fato coincidiu com o aumento do crédito privado para empresas grandes (via mercado de capitais) e pequenas (via crédito bancário).

Essa relação não prova causalidade, mas é exatamente o que deveríamos observar: se crédito do BNDES e crédito privado são substitutos.

Mercados de créditos são sujeitos a fortes imperfeições. Intervenções estatais podem ser benéficas —eu já argumentei em favor do teto de juros no cheque especial, por exemplo—, mas podem atrapalhar bastante e, portanto, precisam ser muito bem justificadas.

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