Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Descrição de chapéu juros inss

Os tetos nos juros do consignado e do cheque especial

O teto parece vir na onda do desprezo por livros de economia e relatórios técnicos do BC

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O teto de juros de 1,7% ao mês no crédito consignado foi um fiasco. Assim que entrou em vigor, bancos suspenderam concessões de crédito nessa modalidade.

Não foi assim em janeiro de 2020, quando o Banco Central instituiu um teto de juros sobre o cheque especial de 8% ao mês para pessoas físicas. Como mostra o quadro, a taxa média para pessoas físicas caiu quatro pontos percentuais (por causa do teto), enquanto a taxa para pessoas jurídicas não se alterou.

O interessante é que o montante de crédito para pessoas físicas e jurídicas se comportou de maneira muito semelhante desde então (note a grande queda no crédito com a pandemia).

Diferentemente do que aconteceu agora, o teto de juros no cheque especial de 2020 não alterou significativamente a oferta de crédito.

Por que os tetos nos juros tiveram efeitos tão diferentes?

Para responder a isso, precisamos antes entender a causa dos juros tão altos às pessoas e empresas no Brasil.

A alta inadimplência explica uma parte do problema. Se muitos não pagam suas dívidas por completo, os juros aos que pagam precisam compensar o banco pelas perdas com os outros empréstimos.

Os empréstimos consignados permitem que as pessoas ofereçam seus salários futuros como garantias de empréstimos. Efetivamente, as possibilidades de calote são muito menores. De fato, as taxas de juros nessas modalidades de empréstimo são bem mais baixas, e há sólida evidência empírica mostrando que as regras do empréstimo —que dificultam o calote— explicam boa parte dessa diferença.

Entretanto, como mostra o Relatório de Economia Bancária do Banco Central, a inadimplência é apenas parte da história. A margem dos bancos, em geral, é grande.

Se a diferença entre o custo para os bancos e a taxa dos empréstimos (o chamado spread) é muito alta, a culpa é da falta de concorrência entre instituições financeiras.

Que fatores afetam a competição bancária?

De modo geral, há mais concorrência quando é fácil migrar para outro fornecedor de um bem ou serviço.
Assim, num mundo onde dar calote é muito difícil e a taxa de calote é muito baixa, a competição deve ser mais acirrada. Afinal, nesse caso, um tomador de crédito consegue rapidamente propostas de empréstimos de outras instituições e pode escolher a menor taxa de juros.

Por outro lado, se há muito calote, uma instituição terá mais receio e demorará mais para dar crédito a um estranho. Assim, o banco que conhece o cliente pode cobrar uma taxa maior sem perdê-lo.

Uma implicação é que a concorrência deve ser muito mais acirrada no mercado de crédito consignado que no cheque especial. Assim, a margem dos bancos deve ser bem menor. Isso explicaria os efeitos tão diferentes dos tetos de juros em 2020 e 2023.

De fato, o Relatório de Economia Bancária do BC mostra que o consignado é um dos mercados de crédito que têm menor concentração —ou seja, mais concorrência. Isso tende a levar a um spread menor.

O teto de juros no cheque especial em 2020 foi justificado por uma nota técnica do BC muito boa. A nota argumentava, com teoria e dados, que a demanda por crédito no cheque especial era muito pouco sensível a taxa de juros e a competição não era suficientemente forte.

Por outro lado, o teto de 2023 parece vir numa onda de desprezo por livros de economia e relatórios técnicos do BC.

Há muito espaço para melhorar o mercado de crédito brasileiro. Pesquisadores são discretos e silenciosos, mas seus livros, artigos científicos e notas técnicas trazem muita informação para quem formula políticas públicas.

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