Bia Braune

Jornalista e roteirista, é autora do livro "Almanaque da TV". Escreve para a Rede Globo.

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Bia Braune

Meu filho dorme ao som do teremim, o instrumento mais excêntrico que já existiu

Dominada por Clara Rockmore, engenhoca que enfeita a noite do meu bem produz notas capazes de quebrar cristais

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O relato a seguir requer uma trilha sonora de filme de ficção científica tocando na sua cabeça. Serve também aquele uivo metálico de quando os fantasmas surgem em “Scooby-Doo”. Esse é o clima ideal para falarmos de uma artista obscura e o instrumento musical mais excêntrico que já existiu.

Na noite em que conheci Clara Rockmore, a missão era pôr meu filho para dormir e eu já tinha esgotado todos os hits de ninar. Nisso, o Spotify sugeriu a inusitada versão de Clara para “La Vie en Rose”. Parecia executada por um enxame de abelhas. Na sequência, as “Bachianas” de Villa-Lobos na mesma pegada. Deu-se então o fenômeno: a criança apagou.

Grata pelas horas de sono, pesquisei mais sobre essa musa magnética. Judia nascida na Lituânia, aos quatro anos era um prodígio do violino. Aos seis, fugiu da Revolução Russa numa carroça. Chegou a Nova York nos anos 1920, quando uma artrite no braço a impediu de continuar na música.

Até que conheceu Leon Theremin, inventor e espião. Ele se apaixonou por Clara, pediu-a em casamento e tomou um toco, mas vamos pular essa parte porque o grande amor da nossa heroína viria a ser a engenhoca que Leon havia construído e que foi batizada com o nome dele —o teremim.

menina dança diante de robô
Marcelo Martinez/Folhapress

Para compreender melhor como o instrumento funciona, assisti a tutoriais ininteligíveis no YouTube. E intocável, a meu ver, é sua melhor definição. Pelo grau de dificuldade, mas sobretudo por emitir sons através de duas antenas e campos eletromagnéticos, sem que o solista precise encostar um dedo no aparelho.

Ainda que produza notas capazes de rachar cristais, o teremim é astro pop discreto. Usado como efeito sonoro, figura em playlists ao lado dos Beach Boys, Led Zeppelin, Pato Fu e Rita Lee, que nos Mutantes levou a geringonça para o palco dos festivais em 1968.

Nada, porém, supera as performances da própria Clara. Vale a pena vê-la já idosa, tocando “O Cisne” de Saint-Saëns num vídeo raro. Com movimentos sutis, ela tem domínio absoluto da melodia que flutua pelo ar. Tanto que o Google a homenageou em 2016, transformando seu serviço de busca num grande teremim online. Durante 24 horas, fomos todos "Rockmores in concert".

Hoje, não tem mais Bita ou Palavra Cantada. “Toca a playlist, mãe.” São teremins para enfeitar a noite do meu bem, que repousa tranquilo com o tema do robô que apavora a humanidade no filme “O Dia em que a Terra Parou”.

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