Bia Braune

Jornalista e roteirista, é autora do livro "Almanaque da TV". Escreve para a Rede Globo.

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Bia Braune
Descrição de chapéu

De 'kkkk' a 'haha', não dá para confiar na sinceridade do riso online

Emojis pontuam raciocínio digital, mas, em mãos erradas, assemelham-se a quem fala cuspindo

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Se algum dia você me mandar mensagem e eu responder com um "kkkk", chame a polícia. Ou o Samu no 192. Rápido, por gentileza, porque um golpista bonachão do Pix me hackeou. Ou então escorreguei, bati a cabeça e estou pedindo socorro, estatelada no chão. Pressionando essa única letra sem querer com o que me restou de mobilidade no dedo.

A ilustração de Marcelo Martinez faz referência a um famoso painel da HQ 'A piada mortal', de Alan Moore e Brian Bolland, que mostra o personagem Coringa rindo de forma ensandecida. Na versão de Martinez, o personagem ri utilizando elementos de comunicação na internet, como "kkk", "rsrsrs", teclas aleatórias e emojis.
Ilustração de Marcelo Martinez para coluna de Bia Braune de 8 de maio de 2023 - Marcelo Martinez

Em qualquer bate-papo, me percebo insistindo nesse negócio abstrato que se chama "tentar entender o que o outro quer dizer". Se ao vivo já não é exatamente fácil, online tudo pode virar uma desgraceira.

Claro, emojis são úteis. Eles pontuam o raciocínio digital. Mas, em mãos erradas, assemelham-se a quem fala perto demais, cospe e cutuca, durante explicações intermináveis. Geralmente em filas. Cada joinha equivalendo a um "entendeu?" Soquinho, high-fivezinho. "Entendeu, entendeu?"

Agora, se até o dicionário Oxford elegeu o ícone chorrindo como palavra do ano em 2015, quem sou eu para não prestigiar inclusive os obscuros?

Faço puxadinhos em vários assuntos, só para anexar serrotes, besouros e o emoji do bigodudo dançando. Reparou que não tem de arara? Quando ornitólogos conversam sobre, acredite, eles se veem obrigados a digitar a palavra inteira.

Figurinhas? Já escrevi sobre elas e não gostaria de ocupar espaço neste jornal sobre tão polêmico tema. Um disparate e tanto, eu invadir a diagramação da tirinha da Laerte para biscoitar a Nazaré confusa.

Minha nota de repúdio destina-se apenas às risadinhas virtuais. Ontem mesmo, enquanto explanava uma angústia existencial, fui brindada com um "hehehe". Compaixão jocosa? Trollagem reversa? Não merecia. Logo eu, que acolhi "hahahas" supostamente francos.

Há piores, contudo. Como lidar com a afronta marota de um autoexplicativo "risos" lançado ao final de um enter?

"Não captou minha fina ironia, ó vacilão ignóbil? Toma meu senso de humor: risos!" Ou sua versão lelesque, igualmente cruel, "rsrsrs", vulgo "gasto nem minhas vogais com você".

Argentinos curtem "jajaja". Russos, "xaxaxa". Se Darth Vader e Mumm-Rá ("rá, rá, rá", retrucariam os onomatopaicos mais cínicos) não só teclassem, como gracejassem, "HWAHWAHWAs" ecoariam sem dó.

O que me resta é encerrar este texto carrancuda, descrente até de "hihihis" pseudo-tímidos e fofos. A menos que alguém me ofereça o tal Pix mencionado lá no início. Aí, kkkkkkkkk.

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