É meritória a discussão sobre políticas públicas elaboradas para combater a evasão e o abandono escolar. Os indicadores disponibilizados pelo Instituto de Mobilidade e Desenvolvimento Social mostram que o problema está concentrado no ensino médio, incide mais que proporcionalmente na população negra e é mais evidente na rede de ensino pública, especialmente nas escolas de nível socioeconômico baixo.
Considerando que a conclusão do ensino médio tem impactos positivos sobre salários e empregabilidade, priorizar políticas públicas que revertam esse quadro tem enorme potencial para aumentar a produtividade do trabalho, o crescimento da economia e a redução das desigualdades.
Nesse sentido, a recém-instituída poupança de incentivo à permanência e conclusão escolar para estudantes do ensino médio é uma política que pode se mostrar capaz de mobilizar os alunos a concluir seus estudos através de recompensas financeiras.
Mas, ainda que haja mérito nessa proposta, a forma através da qual a poupança de incentivo à conclusão do ensino médio está sendo estruturada põe em xeque seu sucesso, seja em razão de sua implementação, seja por causa de seu financiamento.
Até o momento, sabe-se apenas que a elegibilidade se dará entre jovens de baixa renda regularmente matriculados no ensino médio nas redes públicas de ensino, pertencentes a famílias inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do governo federal e elegíveis ao Bolsa Família, mas parâmetros específicos seguem largamente desconhecidos, como os valores, as formas de pagamento, as condicionalidades e a operacionalização da poupança para esses jovens.
Sabe-se, por exemplo, que um pagamento retido, feito ao final do ano letivo, é mais eficaz para a acumulação de capital humano que pagamentos frequentes feitos ao longo do ano, mostrando que dois programas podem ter resultados distintos mesmo quando seus orçamentos são iguais.
E, mesmo que o incentivo financeiro estimule a conclusão do ensino médio, a evasão escolar também está associada a percepções equivocadas sobre a importância do que se aprende nesse estágio educacional e ao valor que a formação agrega à trajetória profissional dos jovens, abrindo espaço para que ações direcionadas à reformulação de currículos e a melhorias de gestão nas escolas sejam consideradas de forma alternativa.
Com relação ao orçamento destinado ao programa, a proposta encaminhada pelo governo abre espaço para que esse gasto seja excluído das regras do novo arcabouço fiscal ao permitir que o programa seja financiado fora do orçamento público.
A intencionalidade do governo nessa manobra traz consequências deletérias para a credibilidade das regras fiscais, ainda que seja possível reverter os dispositivos que autorizam a excepcionalidade na análise que será feita pela Câmara.
Ela revela a baixa disposição do governo em respeitar regras que ele próprio criou e reforça a visão de que eventuais dificuldades no cumprimento do resultado primário prometido serão contornadas através de interpretações criativas que limitam o contingenciamento de despesas ou mesmo através da própria mudança da meta de primário, conforme se vê em discussões recentes.
É um erro acreditar que a expansão do orçamento sem atenção aos detalhes de implementação de uma nova política pública e sem considerações sobre alternativas mais eficazes para alcançar o objetivo desejado trará resultados, especialmente quando a expansão dos gastos impõe custos para a credibilidade fiscal.
O mérito de um programa não pode ser motivo para abrir exceções na regra fiscal. Pois, se gastos meritórios passassem a receber fonte de financiamento independente e fora da regra fiscal, nada restaria dentro dela. Afinal, todo gasto público é (ou deveria ser) meritório.
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