Cida Bento

Conselheira do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), é doutora em psicologia pela USP

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Cida Bento

Que o 13 de Maio permaneça como dia de protesto e de uma abolição inconclusa

Judiciário pune com desproporção os moradores de favelas, via encarceramento em massa

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Nos últimos anos, foi possível acompanhar uma sequência de prisões de políticos da elite carioca, todos envolvidos em esquemas de corrupção. Em menos de cinco anos, foram cinco governadores e um prefeito.

Um desses ex-governadores se referiu à Rocinha, favela carioca, como “fábrica de produzir marginal”. No entanto, é ele quem está preso há anos, acusado de ter lavado milhões de reais, de propina obtida de fornecedores do estado, e ainda chegou a propor para a população favelada e negra o aborto como política de prevenção da criminalidade.

Governadores são administradores públicos que demandam ou aprovam planos para órgãos policiais “barbarizarem” as favelas, exercendo uma política da morte, com tantos assassinatos, conforme observamos no Jacarezinho.

No entanto, muitas vezes são eles, bem longe das favelas, que cometem os “crimes de colarinho branco”. Em sua grande maioria, esses crimes são praticados por homens, que não são jovens, com anos de experiência no ambiente em que praticam o crime. Não são pobres ou periféricos, são brancos, têm influência social e principalmente poder, como sinalizei nesta coluna, meses atrás. E raramente são punidos, pois, segundo estudiosos, a dificuldade está em enxergar esse perfil de pessoas como perfil de um criminoso.

“Temos uma Justiça tipicamente de classe: mansa com os ricos e dura com os pobres. Leniente com o colarinho branco e severa com os crimes de bagatela. Meninos da periferia com quantidades relativamente pequenas de drogas são os alvos preferenciais do sistema”, escreveu o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso em 2019.

Assim é que o tráfico lidera as imputações para o encarceramento, pois 54% dessas pessoas cumprem penas de até oito anos, o que demonstra que o aprisionamento tem sido a única política diante de pequenos delitos. E o foco são negros e negras: 64% da população prisional é negra, sendo que 2 em cada 3 mulheres presas são negras (67%), como nos mostra Dina Alves.

De outro lado, em 2012, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) identificou 25.799 processos envolvendo o que se costuma chamar de “crimes do colarinho branco” em tramitação na Justiça brasileira. Porém, apenas 205 réus foram condenados definitivamente.

A mesma pesquisa indica que, do total de 1.763 denúncias criminais relacionadas a corrupção e lavagem de dinheiro, registraram-se 594 julgamentos definitivos e 96 processos foram arquivados por demora no processo, ou seja, prescritos.

Nesse contexto, o Judiciário, também com perfil majoritariamente branco e masculino, por meio de pacto narcísico —pacto de fortalecimento e proteção entre os que se consideram “iguais”—, institucionalmente contribui para proteger os bandidos dos crimes de colarinho branco, punindo com extrema desproporção os moradores de favelas, em sua maioria negros e pobres, via encarceramento em massa.

Isso nos lembra que a necropolítica se encontra em curso, pelas mãos daqueles que foram eleitos pela população do estado. E que o 13 de Maio —dia da abolição formal da escravatura— permanece como dia de protesto e de uma abolição inconclusa.

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