Cida Bento

Conselheira do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), é doutora em psicologia pela USP

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Descrição de chapéu PIB

Precarização fragiliza efeitos do aumento da ocupação

Mais prejudicados, mulheres e negros precisam de ações específicas

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Diante das manchetes positivas e generalistas de parte dos meios de comunicação festejando a melhora do mercado de trabalho, é fundamental não esquecer a perversa desigualdade que estrutura nossa sociedade. Ainda que as estatísticas indiquem um aumento na ocupação da população economicamente ativa, não é possível falar que o mercado de trabalho está prosperando, já que a alta precariedade se mantém persistente.

Um indicador utilizado pelo Radar Ceert, por exemplo, comprova a enorme precarização do trabalho, que, assim como a taxa de desocupação, afeta principalmente as mulheres e as pessoas negras e explicita que o racismo é uma das principais causas das desigualdades no país, destacando-se aí as precárias condições de trabalho em que vivem os negros brasileiros.

Relacionada com baixos salários, insuficiência de horas trabalhadas, informalidade, intermitência, falta de estabilidade e não garantia de direitos, a taxa de precariedade do trabalho alcançou 51,6% no último trimestre de 2022, apontando um crescimento relativo de 9,8% desde o último trimestre de 2015 (Pnad Contínua).

Essa análise revela o outro lado da história contada pelos indicadores que apontam uma melhora nas condições do mercado de trabalho, como a redução de 9,1% para 7,9% na taxa de desocupação, além de um aumento no número de ocupados em cerca de 7 milhões de pessoas entre 2015 e 2022.

O outro lado dessa história é que cresceu também em 7,9 milhões o número de pessoas em trabalhos precários, superando o aumento no total de pessoas ocupadas, e, dessa forma, as condições de milhares de ocupações estão mais fragilizadas e deterioradas.

A juventude brasileira, hoje majoritariamente negra (61%), se encontra cada vez mais atingida por um trabalho instável e precarizado, tendo como única forma de sustento trabalhos em aplicativos de entrega e transporte.

Podemos constatar essa realidade olhando para o perfil dos entregadores ciclistas: homem, jovem, negro, entre 18 e 22 anos de idade e com ensino médio completo, que estava desempregado e agora trabalha todos os dias da semana, sem proteção social e em jornadas exaustivas, segundo pesquisa da Aliança Bike (2019). Ou seja, é urgente construirmos o processo de regulação e regulamentação para trabalhadores e trabalhadoras das plataformas de aplicativos.

É certo que a elevação da taxa de precariedade atinge todos os grupos populacionais, porém os mais afetados são as mulheres e as pessoas negras, com proporções de 54,4% e 59,7% das pessoas ocupadas em condição de precariedade, ante os 49,5% e os 41,7% dos homens e das pessoas brancas, conforme dados do quarto trimestre de 2022.

As mulheres negras em ocupações precárias representam 63,1%, e os homens brancos na mesma condição são 39,3% dessas vagas. De outro lado, elas são minoria na área tecnológica, pois, embora representem 28% da sociedade brasileira, 11% trabalham em empresas de tecnologia e apenas 3% frequentam cursos de engenharia da computação (Report 2022 – PretaLab).

Nesses tempos de renovação que estamos vivendo, urgem a concertação e a implementação de políticas públicas, privadas e sindicais para o enfrentamento dessa desigualdade de gênero e raça, que vão da valorização do salário mínimo à retomada e ao fortalecimento das redes de proteção social, da negociação coletiva e das instâncias de representação de pessoas trabalhadoras.

Acima de tudo, trata-se de um outro conceito de crescimento e desenvolvimento econômico orientado pelos cuidados socioambientais e pela equidade como pressuposto para investimentos no mercado de trabalho, nos processos de geração de empregos de qualidade e nas inovações que precisam ser implementadas.

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