Claudia Costin

Diretora do Centro de Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

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Fronteiras nacionais e problemas globais

Não enfrentaremos vírus ou mudanças climáticas extremas apenas dentro de cada país

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As fronteiras são constructos humanos para integrar territórios nacionais, separar países uns dos outros e dar identidade a seus habitantes. Muitas foram fixadas como consequência de guerras e de acordos diplomáticos que as seguiram.

Em 1919, em tempos de outra pandemia, que contaminou inclusive alguns negociadores de antanho, a cidade de Paris foi invadida por representantes das principais nações envolvidas na Primeira Guerra Mundial para definir as novas fronteiras, as novas identidades nacionais, o destino das colônias e, naturalmente, cobrar dos perdedores pesadas reparações, que acabaram por construir as condições para uma segunda guerra.

Mesmo com as separações e conflitos que geram, acabam cumprindo papel importante quando permitem evitar a propagação de doenças com um complexo controle sanitário, que aparentemente temos certa dificuldade de fazer no Brasil, já que demanda mais do que meras guerras ideológicas. Permitem também que cada país defina sua população com clareza e organize a prestação de serviços públicos aos cidadãos.

Lembrei-me disso ao ler o livro "Inés y la Alegría", da premiada escritora espanhola Almudena Grandes, que relata a invasão do vale de Arán, em outubro de 1944, por um grupo de guerrilheiros espanhóis que cruzaram a fronteira entre seu país e a França, onde estavam exilados. Era uma Espanha sob o jugo do franquismo, que não apenas se alinhava, embora de forma ambígua, aos nazistas como reforçava uma moral ainda mais conservadora do que a vigente na Europa à época.

O relato do cruzamento das fronteiras pelas autodenominadas forças de libertação, de volta à pátria que os expulsara, traz um toque de forte emoção, frente à possibilidade de reaver o país amado e à de construir outra ordem de coisas. A conquista foi temporária, mas a sensação de que era possível transformar a realidade se manteve.

Os nacionalismos do século 19, fortalecidos no 20, enquanto ainda associados ao colonialismo moderno, perderam um pouco de força depois, quando a humanidade constatou que problemas globais demandam soluções em rede. Não enfrentaremos vírus ou mudanças climáticas extremas apenas dentro de cada país.

Nesse sentido, cabe sim falar em soberania, mas limitada pelos desafios que não respeitam fronteiras e nos colocam a todos como uma unidade orgânica: nós, os habitantes do planeta Terra, que só logram resolver problemas universais ao quebrar barreiras que se interpõem entre nações, sem ingenuidade, é claro, mas com a consciência de que precisamos uns dos outros e, mais do que nunca, da ciência, que tende a não reconhecer fronteiras.

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