Claudia Costin

Diretora do Centro de Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

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Salman Rushdie e a tentativa de calar livros e vozes

Assim não se construirá um futuro que valha a pena

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Num livro tão interessante quanto poético, se é que não ficção possa ser dotada de poesia, a linguista e premiada escritora espanhola Irene Vallejo narra a história das bibliotecas, dos livros e de seus autores.

Num capítulo de "O Infinito em um Junco", relata como vozes foram caladas, seja pela queima de livros, censura das obras e torturas ou ameaças, muitas vezes concretizadas, a seus autores. Refere-se, nessa obra de 2019, ao caso de Salman Rushdie, ameaçado por uma "fatwa", que três anos depois lograria colocar-lhe a vida em risco.

Rushdie foi esfaqueado na última sexta-feira (12), pouco antes de participar de uma palestra no estado de Nova York, por Hadi Matar, aparentemente um simpatizante do Irã e da Guarda Revolucionária Islâmica.
A obra ficcional do escritor, "Versos Satânicos", havia merecido o epíteto de blasfema e, em 1989, resultou no decreto de morte por parte do clérigo iraniano Ruhollah Khomeini. Foi igualmente ameaçada a autora de Harry Potter, J.K. Rowling, por ter condenado, em redes sociais, o esfaqueamento do escritor anglo-indiano.

Por que tanto medo de livros, autores e até bibliotecas? Sim, bibliotecas inteiras foram destruídas por guerras e disputas por supremacia cultural, como bem relata Irene Vallejo. Uma cena descrita em "O Infinito em um Junco" retrata como a biblioteca de Sarajevo, em agosto de 1992, final do século 20, foi incendiada durante a guerra da Bósnia, mostrando que nem em "santuários" os livros se encontram protegidos.

Mas não seria mais importante proteger a vida do que as obras? Na verdade, ambos precisam de proteção. Afinal é nos livros que recuperamos as percepções, narrativas, cenários e a incrível aventura humana em diferentes territórios do planeta, a partir da leitura de mundo de seus autores.

O mais importante, no entanto, é possibilitar às novas gerações não apenas o acesso ao acervo que a humanidade, ao longo dos séculos, foi produzindo, seja em meio digital ou físico, e garantir o direito de expressar verdades desconfortáveis ou mundos imaginados por seus autores.

O fundamental é que os jovens desenvolvam as habilidades, os valores e o repertório cultural necessário para entender a riqueza da produção cultural que as obras abrigam, mesmo que, eventualmente, discordemos de seus conteúdos ou visões religiosas.

Afinal, num mundo plural e mais inclusivo, sempre posso responder à voz do outro transcrita em livros de que discordo com a transcrição da minha, com os meus argumentos e minhas visões distintas.

Calar o autor e incendiar livros ou bibliotecas não nos ajudam a construir nenhum futuro que valha a pena!

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