Cláudia Collucci

Jornalista especializada em saúde, autora de “Quero ser mãe” e “Por que a gravidez não vem?”.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Cláudia Collucci

Ao esconder os mortos da Covid-19, governo Bolsonaro reforça discurso negacionista

Faz um mês que política federal só dá ênfase em "curados" e recuperados da pandemia do cornavírus

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Nesta quarta (27), completa um mês que o governo de Jair Bolsonaro tenta esconder os mortos da Covid-19 nas suas redes sociais. O número de óbitos diários desapareceu. Desde 27 de abril, divulga-se apenas o “placar da vida”, com brasileiros "salvos" e em recuperação. Mortes não cabem ali.

Mesmo no último dia 19, quando o Brasil ultrapassou pela primeira vez a marca de mil mortes por Covid-19 em 24 horas, o governo federal ignorou essa escalada na sua propaganda oficial no Twitter.

As publicações, compartilhadas também pelo Ministério da Saúde, são acompanhadas pela hashtag #NinguémFicaPraTrás. Nesta segunda (25), o post oficial trazia 374.898 infectados, sendo 153.833 "brasileiros salvos" e 197.592 em recuperação. Os mais de 23 mil mortos continuam sem menção. Quem quiser que faça a conta.

A decisão de esconder os mortos é da Secretaria de Comunicação Social, a pedido do ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, que no mês passado criticou a cobertura maciça de "fatos negativos" da imprensa brasileira.

O país não tem razão nenhuma para comemorar. Desde o início, sabe-se que mais de 90% das pessoas vão se recuperar da infecção por coronavírus. O problema maior são os casos graves, muitos dos quais vão resultar em mortes.

No Brasil, 23.473 pessoas já ficaram para trás. São 23.473 famílias enlutadas que nem sequer conseguiram se despedir dos seus mortos, enterrados em caixões lacrados, sem velório.

Outros tantos brasileiros estão sendo infectados diariamente e vão precisar disputar leitos de UTI para ter alguma chance de sobrevivência.

No dia em que houver leitos e equipamentos de terapia intensiva suficientes para todos e equipes de profissionais bem treinados, no dia em que as mortes e os casos caírem vertiginosamente, aí sim teremos motivos para comemorar.

O "placar da vida" é só mais um componente do discurso negacionista de Bolsonaro, que tenta minimizar a gravidade da pandemia. Somam-se a ele a resistência ao isolamento social e o apego ao uso em massa da cloroquina, sem evidência científica de eficácia e segurança.

Destacar apenas dados positivos de recuperados ou em recuperação no momento em que os casos de mortos e infectados de Covid-19 estão em ascensão é só mais uma tentativa de o governo transmitir uma falsa de ideia de que as coisas estão sob controle. É só mais propaganda enganosa.

Os mortos nesta pandemia não são apenas números e estatísticas. São os nossos mortos. São as nossas mães, nossos pais, nossos filhos e filhas, nossas avós e avôs, nossos médicos, nosso pessoal da enfermagem. São a nossa gente.

São mortes que não podem ser esquecidas. Na contramão da insensibilidade do governo federal, há movimentos na sociedade civil, como o projeto Inumeráveis, que dão visibilidade a essas pessoas.

A advogada Luciana Dadalto, pesquisadora de temas de bioética, resumiu bem o motivo pelo qual não podemos comemorar o “placar da vida” do governo Bolsonaro.

"Ele esconde um desprezo absoluto pelas vítimas da Covid-19 e dificulta o luto dos familiares que, além de terem que lidar com a morte repentina e a impossibilidade de despedida ainda sofrem com a invisibilidade de sua dor. Não podemos naturalizar as mortes por Covid-19!"

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.