Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Clóvis Rossi

Crônica de uma fraude anunciada

Crédito: Palácio Miraflores/Reuters Venezuela's President Nicolas Maduro (C) greets supporters as he arrives for an event with women, next to his wife Cilia Flores (centre R), in Caracas, Venezuela January 25, 2018. Miraflores Palace/Handout via REUTERS ATTENTION EDITORS - THIS PICTURE WAS PROVIDED BY A THIRD PARTY ORG XMIT: MIR101
O presidente da Venezuela Nicolás Maduro cumprimenta apoiadores ao chegar para evento, em Caracas

Informa Alejandro Werner, economista-chefe do FMI para a América Latina: a economia da Venezuela sofrerá este ano uma queda de 15% e a inflação poderá chegar a inacreditáveis 13.000%.

No ano passado, a queda foi igualmente impressionante (14%), com o que a riqueza do país sofreu uma contração de 50% nos seis anos mais recentes.

Em nenhum país nessas condições, o governo de turno poderia esperar vencer a eleição, ainda mais que se trata do mesmo regime nesses seis anos de colapso sem igual na história latino-americana.

Como se explica, então, que o governo de Nicolás Maduro anuncie a antecipação para abril de eleições em tese esperadas para mais perto do fim do ano? Não é preciso ser um Mauro Paulino (Datafolha), meu guru em eleições, para afirmar que o governo venezuelano sabe que, sem variados trambiques, jamais ganharia uma eleição, qualquer que fosse. Logo, só a certeza de que praticará mais uma fraude explica a convocação de eleições.

Para a antecipação da data, há uma especulação ainda mais sinistra, dada por Geoff Ramsey, pesquisador de Venezuela no Washington Office on Latin America: para ele, o governo aposta que, adiantando as eleições, sofrerá menos desgaste ante uma maior deterioração econômica, inevitável quanto mais esperar.

Por sinistra que seja, a especulação é razoável: primeiro porque Maduro será reeleito com o indispensável apoio dos trambiques. Hipótese reforçada pelo primeiro deles: a coalizão opositora MUD (Mesa da Unidade Democrática) foi proibida de concorrer com esse rótulo.

Os partidos que a integram terão, portanto, se quiserem disputar, que entrar com mais de uma candidatura, dividindo seus votos contra o concorrente único do governo.

É verdade que nada impede que o presidenciável de oposição seja único, apresentando-se por um dos partidos que compõem a MUD. Hipótese lógica que, no entanto, colide com as divisões internas na coalizão e seu estado de debilidade mais ou menos crônica e acentuada nos últimos tempos, em parte pela repressão do governo e em parte por sua própria incapacidade.

Com Maduro reeleito, não há perspectiva de mudança nas políticas até agora adotadas e que levaram a um desastre de proporções bíblicas.

Logo, é de se esperar que a Venezuela afunde ainda mais e continue isolada no cenário internacional. O presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, já avisou: "Ninguém vai reconhecer o resultado das eleições na Venezuela. Essas eleições foram convocadas por uma instância que tampouco é valida, como é o caso da Assembleia Constituinte.

A Constituinte foi convocada para marginalizar a legítima instância legislativa, que é a Assembleia Nacional, de maioria opositora.

O problema com essa afirmação é que a comunidade internacional se limita à retórica e não consegue achar um caminho para impedir a continuidade do desastre. Nada de novo: o mundo assistiu impotente o colapso da

Síria, até contribuindo para ele com intervenções militares. A única diferença na Venezuela é que não houve intervenções militares.

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