Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Clóvis Rossi
Descrição de chapéu Espanha

Líder espanhol foge das urnas, como Temer

Pedro Sánchez assume depois de obter apenas 22% dos votos há 2 anos

Pedro Sánchez discursa durante votação moção de censura no Parlamento, em Madri (Espanha) - Emilio Naranjo/AFP

Pedro Sánchez, o líder do PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol), assume o governo da Espanha com o mesmo pecado original de Michel Temer no Brasil: nem um nem o outro tiveram votos para banhar de legitimidade o mandato a que ascenderam em circunstâncias anômalas.

A favor de Sánchez, só o que se pode dizer é que ele não tinha alternativa, no primeiro momento, a não ser fazer o que fez. Depois que a justiça condenou por corrupção o PP (Partido Popular, do então presidente do governo Mariano Rajoy), apresentar uma moção de censura era o que a oposição tinha a obrigação de fazer.

Acontece que a legislação espanhola obriga o partido que pede a censura do governante de turno a propor, simultaneamente, um nome para substitui-lo, para o caso de a censura passar. Como foi o PSOE quem propôs a decapitação de Rajoy, só podia mesmo oferecer Sánchez, seu secretário-geral, como substituto.

Onde começa o pecado é no fato de o líder socialista não ter anunciado imediatamente depois de sua ascensão a convocação de eleições para legitimar o novo governo (ou para que o eleitorado decida quem deve liderá-lo).

Temer também foi o beneficiário da moção de desconfiança contra Dilma Rousseff (na forma do impeachment, que é o que prevê a legislação brasileira). Mas tinha o dever ético de renunciar, para que houvesse uma nova eleição, que banhasse de legitimidade eleitoral um mandato juridicamente legítimo.

Seria a melhor maneira de tentar evitar o tumulto institucional em que vive desde que assumiu.

No caso da Espanha, o jornal El País, historicamente próximo dos socialistas, antevê para Sánchez a mesma instabilidade que cerca Temer.

Editorial publicado já na véspera do afastamento de Rajoy diz que “a governabilidade da Espanha está a ponto de passar das mãos de um líder, Mariano Rajoy, culpado desta crise institucional por sua incapacidade para afrontar sua responsabilidade política, a outro, Pedro Sánchez, que rechaça acudir à cidadania para obter um mandato claro para seguir adiante".

Sánchez torna-se presidente do governo tendo obtido apenas 22,63% na eleição geral mais recente (2016). Sua situação, aos olhos do público, só fez piorar de lá para cá: a mais recente pesquisa do instituto Metroscopia mostra o PSOE em quarto lugar na preferência do público, com 19% das intenções de voto, em empate técnico com Podemos e o destronado Partido Popular.

O partido preferido no momento é o Cidadãos, de criação recente, centrista inclinado à direita, e que votou contra a destituição de Rajoy.

Para fechar o imbroglio, Sánchez teve que contar com os votos de partidos independentistas da Catalunha, quando o seu próprio partido é contra o processo em curso naquela região.

El País comenta que, ao fugir das urnas, os partidos tradicionais (PSOE e PP) pretendem “evitar o castigo de seus eleitores", mas prevê que, a longo prazo, é mais provável que agravem o castigo.

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