Conrado Hübner Mendes

Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC

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Descrição de chapéu Folhajus

Rosa Weber e as futuras gerações

Pautar casos difíceis e combater libertinagem de magistrados são marcos históricos

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A ministra Rosa Weber fez mais pela respeitabilidade do Supremo Tribunal Federal do que qualquer presidente da corte dos últimos 30 anos. E coloca nas costas de seu sucessor, Luís Roberto Barroso, a responsabilidade de manter o padrão.

Rosa Weber teve coragem de pautar casos urgentes obstruídos por ministros: marco temporal, drogas, juiz das garantias etc. Da discreta cerimônia de posse, sem farras lobísticas; da resolução para reduzir poderes monocráticos de ministros; de sua reação altiva e enérgica à depredação do tribunal no 8 de janeiro, o balanço de sua gestão e de sua postura é uma canoa republicana num oceano de promiscuidade.

No final de seu curto mandato na presidência do STF, Weber precisa de apoio público para que adversários na corte não bloqueiem tantas de suas iniciativas. Nesses próximos dias, dois assuntos cruciais foram encaminhados pela ministra para julgamento.

A ministra Rosa Weber, que vai se aposentar em setembro - Pedro Ladeira - 22.out.18/Folhapress

O primeiro trata da obrigação do país de mitigar a mudança climática por meio do controle do desmatamento; o segundo, no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), busca implantar bases éticas para o comportamento judicial. O primeiro diz respeito ao futuro do planeta; o segundo, ao futuro da democracia, da separação de Poderes e da independência judicial no Brasil.

O STF prometeu retomar, neste 17 de agosto, a ADPF 760, ação mais emblemática sobre mudanças climáticas da história nacional, que almeja garantir implementação das políticas de redução do desmatamento na Amazônia e cumprimento das metas do Acordo de Paris.

O "Plano de Ação para Prevenção e Combate ao Desmatamento da Amazônia" (PPCDAm), primeira política de Estado contra o desmatamento na Amazônia, foi criado em 2004. Desde então, o desmatamento caiu 83% no bioma até 2012. Daí em diante, o cenário regrediu dramaticamente.

O governo Bolsonaro extinguiu o PPCDAm e deixou nada no lugar. O resultado: em 2019, o desmatamento aumentou de 7.800 km² para 10 mil km²; em 2020, subiu para 10,8 mil km²; em 2021, atingiu 13 mil km², quase nove vezes o tamanho da cidade de São Paulo.

No Brasil, quarto maior emissor do planeta, o desmatamento é a principal fonte de emissões que impactam o clima (46%). Para cumprir suas metas do Acordo de Paris, o Estado deve basicamente controlar essa prática.

Em 2022, o julgamento começou pelo voto de Cármen Lúcia. André Mendonça pediu vistas e suspendeu a deliberação (como fez com o marco temporal). A ministra reforçou que o direito ao meio ambiente equilibrado define condições de justiça para as gerações presentes e futuras. Declarou o "estado de coisas inconstitucional" do desmatamento.

Essa categoria jurídica foi concebida para expressar não a violação pontual da Constituição, mas "quadro estrutural de ofensa massiva, generalizada e sistemática" de direitos. Espera-se que o STF contribua ao diálogo global da litigância climática e ao projeto constitucional ambiental brasileiro. Com o devido senso de urgência.

Em outra frente, Rosa Weber apresentou ao CNJ proposta de resolução para disciplinar a antiética judicial.

Certos juízes normalizaram condutas que toda cartilha de ética judicial no mundo desaprova. Rotinizaram práticas patrimonialistas: eventos em Lisboa e em Nova York com grandes agentes políticos e econômicos, palestras em banco, mimos de todo tipo. Tais práticas produzem impacto imensurável na imagem de imparcialidade da corte.

A proposta de Rosa Weber prevê medidas para evitar conflitos de interesse e promover a imparcialidade. Exige transparência ativa da agenda de juízes, e informação sobre encontros com agentes públicos e privados; relatório de variações patrimoniais relevantes; regula os conflitos de interesse derivados da participação de magistrados, sob o cínico pretexto de "docência", em eventos de lobby.

A resolução, se aprovada e obedecida, moralizaria parte do descalabro. Ministros do STF entendem, afinal, que não se subordinam a normas disciplinares. A razão de regras de decência se aplicarem a juízes, mas não a ministros do STF, explicamos depois. O receio, agora, é que conselheiro do CNJ peça vistas e espere Rosa se aposentar. Caberá a Barroso resgatar a causa.

Rosa Weber definiu um padrão de integridade judicial. Não será no centrão magistocrático e advocatício que Lula vai encontrar substituto à altura.

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