Gelo e gim

Coluna é assinada pelo jornalista e tradutor Daniel de Mesquita Benevides.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Gelo e gim
Descrição de chapéu receitas alimentação

Salman Rushdie e o coquetel sandinista

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Aventureiro nato, o húngaro Agoston Haraszthy vagou pelo Velho Oeste no meio do século 19 e foi parar na Califórnia, atraído pela corrida do ouro. Sua pepita, no entanto, acabou sendo a uva. Com vinícolas em Sonora, ficou conhecido como o pai dos vinhos californianos.

Sua técnica inovadora para expandir rapidamente as plantações deixou a uva mais vulnerável às pragas. Faliu, e foi para Corinto, na Nicarágua, onde investiu na cana-de-açúcar visando abrir uma destilaria de rum. Mas os planos terminaram na goela de um crocodilo, que devorou o incauto. (Metáfora pronta: Corinto, na costa do Pacífico, viria a ser ponto estratégico dos Contras nos anos Reagan).

Ao lado da Costa Rica, Honduras, El Salvador e Guatemala, a Nicarágua foi parte do Primeiro Império Mexicano, assim como a Califórnia e sua então capital, Sonora, terra de tintos futuros. Obtiveram a independência do breve império há exatos 200 anos.

O próximo dia 19 marca também o aniversário da derrubada do ditador Somoza, na Nicarágua. Os guerrilheiros seguidores de Sandino, herói do chapéu vulcânico, que havia lutado contra a ocupação estadunidense nos anos 1920, conseguiram unir católicos progressistas, a população urbana de classe média, poetas e intelectuais, e a massa campesina no projeto coletivo de reerguer a nação.

Apoiador da Frente Sandinista de Libertação da Nicarágua, FSLN, Salman Rushdie foi em 1986 ao pequeno país, a convite de seu Ministério da Cultura. Fazia sete anos que Somoza, típico caudilho sanguinário, não pisava ali. Ortega era então um líder venerado. Tudo mudaria radicalmente, como se sabe.

Em "O sorriso do Jaguar" Salman Rushdie descreve detalhes curiosos do que viu, como crianças jogando cartas feitas de páginas do Tio Patinhas ao som de "Born in the USA", e fala com admiração dos jovens na resistência aos ataques financiados pelos EUA , assim como da reforma agrária: "Eles estavam inventando o próprio país e, mais que isso, a si mesmos".

Numa fiesta, entusiasma-se com a salsa e a "Internacional", entremeadas de gritos de alegria e de "Patria libre o morir!", e comenta o rum local, "o melhor do mundo", que tomou com coca-cola —o Nica Libre, alusão à ilha próxima em distância e ideologia. Mágico, o rum fez com que se arriscasse na dança.

Rushdie estava se referindo ao Flor de Caña, produzido à sombra do maior vulcão do país, o San Cristóbal. Afora o destilado de melaço, a bebida tradicional nicaraguense é o pinolillo, feita com milho, cacau e canela. Existe também a chicha bruja, um fermentado natural de milho e frutas.

Quem quiser beber uma cervejinha, tem como opção a Toña. O guaro, aguardente popular em todo o continente, também é encontrado nos bares nicaraguenses, onde outrora Rubén Darío, fundador da poesia moderna em espanhol, dono de um "fluxo verbal inalcançável", de acordo com Roberto Bolaño, era visto afogando as mágoas amorosas e existenciais.

Um concurso em Manágua, capital do país, elegeu o coquetel nacional: macuá. Sua criação é recente, mas o status de soft power já está garantido. Política à parte, vale experimentar. E fazer um brinde a Sandino —esse sim, digno de todas as homenagens— e aos poetas Gioconda Belli e Sergio Ramírez, que um dia encabeçaram a revolução e hoje estão proibidos de voltar para casa.

Macuá

Ingredientes

• 45 ml de rum

• 30 ml de suco de goiaba

• 30 ml de suco de laranja

• 15 ml de suco de limão siciliano

• 10 ml de xarope de açúcar

preparo

Bata os ingredientes e coe para um copo Collins com gelo. Use uma fatia de laranja como guarnição

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.