O poder de Janis Joplin não estava apenas na voz. Ela não levava desaforo para casa, nem que fosse do papa —ou, no caso, de Jim Morrison, com quem teve um brevíssimo affair. Ele teria ficado obcecado pela roqueira texana e acabou demonstrando isso da pior forma possível. Num pequeno club de Nova York, em que músicos famosos se encontravam para jams depois de seus shows, o Lizard King passou dos limites. Depois de importuná-la, puxou seus cabelos e a derrubou no chão.
A história é contada de diversas maneiras. Uma delas diz que nesse momento ela quebrou uma garrafa na cabeça do inconveniente ilustre. E derramou o conteúdo de seu copo nele. Outra versão reza que Jimi Hendrix estava no palco. Fora de si e possivelmente querendo roubar o show, Morrison ajoelhou-se diante do guitarrista e começou a gritar propostas de fellatio. Irritada com a performance patética, Janis foi até lá e deu-lhe a tal garrafada. Os três se engalfinharam. Amor, ódio, loucura e admiração mútuas numa poça de álcool e cacos de vidro. Os três morreriam meses depois, aos 27 anos.
Em "…E o Vento Levou", uma sulista apimentada e resiliente faz qualquer coisa para manter a fazenda da família em meio à Guerra de Secessão. Mesmo que fosse preciso se casar com um milionário cínico, de sorriso sexy e má fama. Apaixonada por outro, porém, um cavalheiro insípido e honrado, casado com uma dama de santidade irritante, ela vai abatendo homens com a mesma indiferença com que afoga mágoas no conhaque, em seu boudoir.
Num momento em que se sente mais próxima de seu amor platônico, Scarlett O'Hara decide encerrar as atividades de alcova com o —agora, sim— marido, Rhett Butler. Este sai arrebentando a porta do quarto com um pontapé, serve-se de uma bebida, toma um gole, faz uma careta de desgosto e lança a taça num retrato enorme da esposa, que chora lágrimas de xerez.
As duas histórias têm pontos evidentes em comum, especialmente a marca de paixões violentas. Mas também o Southern Comfort. Licor à base de bourbon, frutas e especiarias, surgido primeiro em New Orleans, em 1874, era a bebida favorita de Janis Joplin. A cantora de "Me and Bobby McGee", levava sempre uma garrafa de SoCo na bolsa. Foi com uma dessas que nocauteou o líder dos Doors. Ela aparecia tanto com a bebida em fotos e shows que ganhou um casaco de pele da destilaria.
O Southern Comfort também é o principal ingrediente nos coquetéis batizados com o nome das personagens centrais de "…E o Vento Levou", Scarlett e Rhett. O filme foi lançado em 15 de dezembro de 1939. Feitos os ajustes, é provável que seja a produção mais lucrativa do cinema.
O racismo explícito nas suas quase quatro horas é intragável, mesmo que Hattie McDaniel tenha levado o Oscar de atriz coadjuvante, sendo a primeira pessoa negra a ganhar o prêmio. Ainda assim, é difícil tirar os olhos da inglesa (!) Vivien Leigh, que incendeia a tela numa dança do desejo com Clark Gable.
Ao fundo, vermelhos e laranjas reproduzem o calor das guerras e dramas íntimos e lembram a cor do coquetel feito para ela, lançado junto com o filme. Bem-humorada, Janis poderia tomar um gole e brindar, com os punhos cerrados, olhando para o céu: "Com Deus como testemunha, nunca mais passarei sede".
SCARLET O'HARA
50 ml de Southern Comfort
60 ml de suco de cranberry
15 ml de suco de limão
Bata os ingredientes com gelo e coe para uma taça martini ou um copo old-fashioned com gelo. Use uma fatia de limão como guarnição.
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