Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

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Deborah Bizarria
Descrição de chapéu jornalismo

Como as emoções influenciam a propagação de fake news

Uma regulação apressada pode acabar provocando efeito contrário ao desejado

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A velocidade de compartilhamento de informações falsas ou mal contextualizadas tem se mostrado um desafio para plataformas digitais e reguladores na tentativa de reduzir seus efeitos na política e na vida das pessoas. Muitos componentes podem contribuir para o sucesso das fake news, desde os algoritmos de recomendação de conteúdo até redes de distribuição intencional. Um fator pouco explorado, mas crucial, é o papel das emoções no consumo e na disseminação de notícias enganosas.

Se emoções e vieses cognitivos não forem levados em conta na compreensão da disseminação de fake news, nenhuma regulação vai conseguir reduzir seus efeitos na sociedade. Mas como funciona esse fenômeno? Gordon Pennycook e outros autores conduziram dois estudos para investigar como o estado emocional e o viés cognitivo das pessoas influenciam sua suscetibilidade a acreditar em notícias falsas.

No estudo 1, os pesquisadores mediram o nível de emoção dos participantes antes de apresentar postagens de notícias falsas e reais. Descobriu-se que uma maior emoção estava associada a uma maior crença em notícias falsas, mas não tinha efeito em notícias reais. No estudo 2, os autores mediram e manipularam a dependência da emoção versus razão dos participantes em quatro experimentos, descobrindo que aqueles que confiaram mais na emoção do que na razão eram mais propensos a acreditar em notícias falsas. Essa relação foi mediada pela avaliação afetiva das postagens e, quando os participantes foram induzidos a confiar mais na razão do que na emoção, sua crença em notícias falsas foi reduzida.

Relação semelhante se observa na propensão a compartilhar notícias enganosas. Em experimentos testados por Galletta e outros autores, os participantes foram expostos a manchetes reais e falsas com diferentes efeitos emocionais e tiveram suas emoções medidas antes e depois da exposição, além das intenções de resposta em curtir, comentar, compartilhar ou verificar as notícias.

Os resultados mostraram que as emoções influenciam as intenções de resposta dos participantes às manchetes de fake news de maneiras distintas. Os participantes com altos níveis de emoções foram mais propensos a espalhar ou suprimir as fake news, enquanto os participantes com baixos níveis de emoções eram mais propensos a ignorar ou se desengajar da disseminação de fake news. Já os participantes com emoções mistas foram mais propensos a verificar a veracidade das fake news.

Além disso, os participantes que foram induzidos a sentir fortes emoções negativas compartilharam mais as fake news do que aqueles que foram induzidos a sentir emoções positivas ou fracas. Ou seja, na prática, fortes emoções são um fator-chave que impulsiona não só o consumo e a crença mas também a disseminação de informação falsa nas redes sociais.

Essas pesquisas ilustram como notícias falsas e reais têm efeitos muito substâncias nas pessoas: elas tocam nas suas emoções. Nesse sentido, consumo e disseminação de notícias enganosas são um fenômeno complexo e emocional, que não pode ser resolvido simplesmente com medidas regulatórias centralizadas e focadas apenas em algoritmos. Considerando os efeitos deletérios da propagação de fake news que afastam usuários do debate e a pressão por regulação no mundo todo, as próprias plataformas digitais devem liderar o esforço na busca por soluções.

Intervenções simples que ajudam os usuários a se tornarem mais criteriosos sobre a veracidade das informações podem ter efeitos significativos. Apresentar aos usuários um lembrete simples sobre a importância da precisão de informações antes do compartilhamento de uma notícia também reduz o compartilhamento de falsidades. Ainda, reduzir incentivos financeiros para quem lucra com a desinformação removendo anúncios de sites de fake news, além do rastreio da origem de notícias falsas, podem ser eficazes.

Mas as plataformas não podem fazer isso sozinhas. As fake news são um problema sério e urgente, precisa ser enfrentado pelo conjunto da sociedade, com cooperação e reflexão conjunta. Uma regulação apressada, pouco debatida e que sequer tangencia os aspectos comportamentais envolvidos com a disseminação das notícias falsas, como tramita agora no Congresso, pode acabar provocando efeito contrário ao desejado.

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