Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

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Descrição de chapéu STF

Na terra da polarização, onde fica a realidade?

Apesar dos desafios, os autores defendem a necessidade de promover maior exposição a visões divergentes e incentivar uma discussão mais baseada em fatos

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Os diálogos obtidos pela Folha revelam como o setor de combate à desinformação do TSE, sob a presidência de Alexandre de Moraes, foi utilizado como extensão investigativa do gabinete do ministro no Supremo. Essas mensagens reacenderam a discussão sobre os limites dos poderes do ministro. O que me chamou a atenção foi como o clima de torcida em torno da figura do ministro ofuscou discussões sérias sobre o papel e os limites das cortes superiores. Não só comentaristas de redes sociais, mas também políticos e jornalistas acabam engolidos pela divisão de times.

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O ministro Alexandre de Moraes participa do seminário A necessidade de regulamentar as redes sociais o Hotel B - Gabriela Biló/Folhapress

A polarização política tem se intensificado em diversas sociedades ao redor do mundo, criando divisões profundas que impactam a convivência, o debate público e a formulação de políticas. O embate entre "direita" e "esquerda" transcende questões meramente ideológicas, atingindo percepções de realidade que são tão divergentes quanto irreconciliáveis. Mas quais são as consequências de uma sociedade polarizada? E como essa divisão afeta a forma como enxergamos o mundo e o que afeta nossas vidas?

Para pensar nisso, gosto de revisitar um estudo de Alberto Alesina, Armando Miano e Stefanie Stantcheva. A pesquisa revela que as diferenças entre republicanos e democratas vão além de simples discordâncias sobre políticas e soluções; elas refletem percepções de realidade completamente distintas. Por exemplo, enquanto conservadores tendem a superestimar as chances de ascensão social, progressistas são bem mais pessimistas. Além disso, republicanos geralmente subestimam a desigualdade de renda e têm uma visão mais negativa sobre consequências a imigração, em contraste com os democratas.

Essas percepções divergentes tornam o diálogo e a formulação de políticas públicas extremamente desafiadores. Quando os grupos políticos não conseguem sequer concordar sobre a natureza dos problemas comuns, a governança se torna ainda mais complicada. Infelizmente, o Brasil parece seguir um caminho similar, com as opiniões políticas cada vez mais refletindo realidades distintas e dificultando a construção de soluções.

O estudo utilizou uma metodologia que combina pesquisas de opinião com experimentos controlados para entender como diferentes grupos políticos processam informações objetivas. Em um experimento chave, os participantes foram expostos a dados pessimistas sobre a mobilidade social nos Estados Unidos. Embora tanto republicanos quanto democratas tenham se tornado mais pessimistas, apenas os democratas aumentaram seu apoio à redistribuição de renda. Isso indica que as crenças políticas pré-existentes influenciam significativamente a forma como as novas informações são assimiladas.

Esse fenômeno, conhecido como "viés de confirmação", faz com que as pessoas aceitem informações que reforçam suas convicções e rejeitem aquelas que as desafiam. Em uma sociedade polarizada, essa dinâmica dificulta ainda mais o diálogo e a formulação de políticas públicas baseadas em uma compreensão compartilhada da realidade.

A polarização afeta profundamente a confiança nas instituições e nas evidências. Quando diferentes grupos políticos interpretam a mesma informação de maneiras opostas, até mesmo dados científicos sólidos podem ser questionados e reinterpretados conforme as lentes ideológicas de cada grupo. Isso alimenta um ciclo vicioso de desconfiança nas instituições, agravando ainda mais a divisão.

Alesina e seus colegas sugerem que, para romper esse ciclo, é essencial abordar as causas subjacentes da polarização, como a segregação da mídia e a tendência de se associar a grupos politicamente homogêneos. Pessoas cercadas por informações que confirmam suas crenças se tornam ainda mais resistentes a pontos de vista divergentes, dificultando a construção de um debate público saudável e construtivo.

Apesar dos desafios, os autores defendem a necessidade de promover maior exposição a visões divergentes e incentivar uma discussão mais baseada em fatos. Isso exige um esforço conjunto de indivíduos, mídia e instituições para superar as barreiras impostas pela polarização.

Em uma sociedade cada vez mais polarizada, o debate público se vê distorcido por visões de mundo opostas e inflexíveis. Fica impossível discutir qualquer tema relevante quando se é automaticamente taxado de bolsonarista ou petista (ou similares). Afinal, a posição de uma pessoa sobre um tema vira sua identidade definitiva e imutável. Quem mais está cansado da briga de torcida na política?

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