Drauzio Varella

Médico cancerologista, autor de “Estação Carandiru”.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Drauzio Varella
Descrição de chapéu alimentação

Os alimentos ultraprocessados e a nossa saúde

Produtos favorecem obesidade, doenças cardiovasculares e diabetes tipo 2, entre outros problemas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Alimentos ultraprocessados estão cada vez mais presentes em nossa dieta. Os levantamentos indicam que de 13% a 21% do total de calorias ingeridas diariamente pelos brasileiros vêm dos ultraprocessados. O fenômeno é mundial. Nos Estados Unidos, respondem por 60% do aporte médio de calorias diárias.

Eles são produzidos a partir de componentes ou substâncias derivadas dos alimentos naturais, em que o processamento industrial adiciona flavorizantes, corantes, preservantes, adoçantes artificias, entre outros agentes químicos. É o caso de salsichas, linguiças, salames e demais embutidos, refrigerantes diet, sopas instantâneas e uma grande variedade de salgadinhos acondicionados nos pacotes coloridos que enfeitam as prateleiras dos supermercados.

São diferentes dos processados ou dos minimamente processados, alimentos integrais cozidos ou fermentados aos quais o fabricante acrescentou dois ou três ingredientes, geralmente sal, açúcar e óleo. Esses dois grupos incluem queijos, pães frescos, sardinha em lata e outros.

O ultraprocessado típico recebe pelo menos dez aditivos que não faziam parte das refeições que nossas avós levavam à mesa. A função é torná-lo mais palatável, crocante, prático e com vida longa nas prateleiras.

O grupo de Eduardo Nilson, da USP, publicou um trabalho sobre o impacto desses alimentos na mortalidade precoce de adultos entre 30 e 69 anos. No período de fevereiro a abril de 2022, ocorreram no Brasil 541 mil óbitos nessa faixa etária. Por meio de modelos matemáticos, os autores concluíram que cerca de 57 mil (10,5% deles) foram causados pelo consumo de ultraprocessados.

Publicado no American Journal of Preventive Medicine, o estudo permitiu concluir que uma redução do consumo de ultraprocessados seria capaz de prevenir de 10% a 50% dessas mortes prematuras.

Uma pesquisa norte-americana publicada na revista Neurology, em julho de 2022, concluiu que um aumento de 10% no consumo de ultraprocessados é suficiente para aumentar o risco de demência em pessoas mais velhas.

Vemos vários mortos-vivos em semi decomposição de frente com expressões vazias devorando sôfregos, salgadinhos, hambúrgueres, cachorro quente, batatinhas, sorvete, balas, biscoitos… tudo industrializado. É uma cena de horror
Ílustração de Líbero para coluna de Drauzio Varella de 8 de maio de 2024 - Libero Malavoglia/Folhapress

Em outro estudo, 20 adultos ficaram encerrados num laboratório durante um mês. Cada participante preparava as próprias refeições. Dez deles cozinhavam apenas com produtos naturais não processados (saladas, ovos, aveia, nozes etc.), enquanto os outros dez comiam ultraprocessados (nuggets de frango, limonada diet, biscoitos, salgadinhos etc). Em ambas as dietas, as quantidades de açúcar, gorduras, sódio e fibras eram idênticas.

Depois de duas semanas os grupos eram invertidos: os que estavam com a dieta rica em ultraprocessados passavam para a de alimentos naturais e vice-versa. Resultado: nas duas semanas de ultraprocessados, os participantes ingeriram em média 500 calorias diárias a mais e engordaram cerca de um quilo.

O custo das refeições com alimentos naturais foi 40% mais alto.

O ultraprocessamento torna os alimentos macios ou crocantes e mais palatáveis e acrescenta a eles mais sal e açúcar, propriedades que estimulam as pessoas a comer mais depressa, sem dar tempo para o intestino enviar ao cérebro os sinais que inibem a fome à medida que comemos.

Eles estão associados à redução dos níveis de PYY, um mediador produzido no intestino para induzir saciedade. Ao mesmo tempo, provocam aumento dos níveis de grelina, mediador produzido no estômago para aumentar a fome.

As informações colhidas por esses e por outros estudos mostram que essa categoria de alimentos contém mais açúcar, sal e gorduras não saudáveis. Costumam ser pobres em fibras, proteínas, vitaminas e minerais, componentes necessários para uma boa refeição.

Tais características lhes conferem baixo potencial para induzir saciedade e aumentam o risco de provocar picos elevados de glicemia. Como consequência, estão associados à epidemia de obesidade, às mortes por doenças cardiovasculares (infartos do miocárdio, AVCs, obstruções vasculares), diabetes tipo 2, aumentos de colesterol e triglicérides, síndrome metabólica, distúrbios gastrointestinais, câncer em vários órgãos e demências.

A educação será o caminho para lidarmos com essa ameaça à saúde pública. Proibi-los é inviável, taxá-los com impostos mais pesados não é fácil: são práticos, acessíveis e relativamente baratos, num país em que milhões de pessoas convivem com a fome.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.