Edgard Alves

Jornalista, participou da cobertura de sete Olimpíadas e quatro Pan-Americanos.

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Edgard Alves

Morte de técnico é um duro golpe na canoagem do Brasil

Jésus Morlán participou da conquista de três inéditas medalhas com o esporte brasileiro

Em vida, Jésus Morlán colocou em prática um bem-sucedido plano de preparação dos atletas da canoagem brasileira
Em vida, Jésus Morlán colocou em prática um bem-sucedido plano de preparação dos atletas da canoagem brasileira - Alexandre Rezende/Folhapress

A canoagem brasileira sofreu um duro golpe com a morte prematura, aos 52 anos, do técnico espanhol Jésús Morlán, em consequência de um tumor no cérebro. Ele era o responsável pela preparação da equipe do Brasil de canoagem de velocidade que conquistou três inéditas medalhas --duas de prata com Isaquias Queiroz, sendo uma delas em parceria com Erlon de Souza, e outra de bronze-- na Olimpíada do Rio, em 2016.

A modalidade ganhou certa notoriedade a partir de 2013 com a chegada de Morlán, que assumiu o comando do time e colocou em prática um bem-sucedido plano de preparação dos atletas. O COB (Comitê Olímpico do Brasil) e a CBCa (Confederação Brasileira de Canoagem) acertaram no centro do alvo quando selecionaram Morlán.

​O convite para que ele viesse trabalhar no Brasil foi precedido pela sua performance na seleção da Espanha, durante a qual se destacou o canoísta David Cal, ganhador de cinco medalhas olímpicas (uma de ouro e quatro de prata). Morlán sempre exigiu disciplina e determinação dos seus comandados brasileiros, que assimilaram sua filosofia de trabalho. Dessa forma, colocou os canoístas numa espécie de isolamento para que aproveitassem ao máximo os treinamentos.

Os selecionados passaram a morar num sítio chamado Recanto da Lagoa, na região de Lagoa Santa, cidade mineira. Lá, sem interferências, aplicou seus conhecimentos sobre alto rendimento nos esportes. Em pouco tempo, a canoagem brasileira virou notícia e, na Olimpíada, os resultados comprovaram o êxito do projeto.

Diagnosticado com câncer cerebral cerca de três meses após os Jogos do Rio, Morlán não desanimou. Submeteu-se a cirurgia e a tratamento com uso de quimioterapia e radioterapia, sem abdicar do comando da seleção, fase pontuada por períodos de afastamentos. Optou por permanecer no Brasil e visitava a mulher e a filha, residentes na Colômbia, a cada três meses.

Deixou claro que queria seguir com seu trabalho, apesar das dificuldades. Isaquias, único brasileiro a conquistar três medalhas numa mesma  Olimpíada, sentia desânimo quando via a luta do treinador contra o problema de saúde. Admirador do espanhol, considerado por ele como um pai,  disse que ia para a água e procurava fazer o melhor treino possível com a intenção de deixar o técnico feliz com o resultado.

Paulo Wanderley Teixeira, presidente do Comitê Olímpico do Brasil, classificou o treinador espanhol como uma pessoa insubstituível, que realizava um trabalho de alto nível, com uma metodologia criada por ele. Jorge Bichara, diretor de esportes do COB, destacou a preocupação de Morlán com o bem estar, a vida familiar e o futuro dos atletas.  O projeto do espanhol envolvia a formação dos seus canoístas não apenas com o objetivo voltado exclusivamente ao esporte.

A ausência de Morlán coloca um ponto de interrogação nas chances de êxito do Brasil na Olimpíada de Tóquio-2020, na qual ele depositava grandes esperanças na conquista de medalhas.  Como reagirá Isaquias Queiroz, o astro da seleção, diante da nova realidade, sendo que sempre se pautou pelas orientações do treinador, que foi fundamental no seu desenvolvimento?

A passagem de Morlán pela canoagem brasileira, no entanto,  não fica restrita ao passado. Consta que seu contrato com a confederação brasileira da modalidade o obrigava a deixar um registro detalhado das atividades realizadas. Fórmula encontrada para replicar a experiência na formação e lapidação de novos atletas. Não deixa de ser uma esperança.

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