Fernando Canzian

Jornalista, autor de "Desastre Global - Um Ano na Pior Crise desde 1929". Vencedor de quatro prêmios Esso.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Fernando Canzian

Para manter inflação baixa, Brasil faz aposta de risco

Sem o apoio de corte nas despesas e reformas, metas futuras podem ser inviáveis

O Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão máximo do sistema financeiro, baixou para 3,75% a meta de inflação de 2021, mantendo intervalo de tolerância de 1,5 ponto para mais ou menos.

Neste ano, a meta é 4,5% e ela cairá a 4% em 2020. Ao baixá-la mais para 2021, o país comete um ato de arriscada valentia.

Inflação sob controle é a melhor política pró pobre que existe, pois mantém o poder de compra dos que teriam menos condições de se proteger, por meio de operações financeiras, quando a moeda perde valor.

Em tempos normais, a decisão seria ótima, e economias desenvolvidas têm metas até menores. Mas será difícil o país cumprir o desejado se mantiver as contas públicas na desordem atual.

Embora o Brasil tenha obtido algum controle nos gastos nos dois últimos anos, despesas fixas como Previdência e funcionalismo vêm engessando o Orçamento de tal forma que em breve não haverá saída a não ser emitir moeda (e gerar inflação) para manter a máquina pública funcionando.

Os números são eloquentes: da despesa primária do governo federal de R$ 1,4 trilhão neste ano, a margem para gastos livres é de meros 6%, disputados a tapa por todos os ministérios para custeio da máquina e investimentos.

Em quatro anos, as despesas com funcionalismo, Previdência e outros gastos assistenciais aumentaram de 12,6% como proporção do PIB para 15,1% (o PIB é usado como parâmetro para se ter uma dimensão relativa ao tamanho da economia do país).

Para financiar essas despesas, a dívida pública bruta do governo saltou, no período, de cerca de 55% para 76% como proporção do PIB, ficando bem acima da média dos emergentes (48%).

Quando se defende reformar a Previdência e o funcionalismo para cortar gastos, muitos reagem: “Por que não cortam nos altos juros da dívida?” Mas não parece razoável achar que o governo distribui juros porque gosta. 

O fato é que ele é pago aos que se dispõem a financiar um governo que não consegue viver dentro do orçamento. Tanto Lula quanto FHC foram obrigados a praticar juros considerados exorbitantes em momentos de desconfiança em relação à solvência do país.

Ao reduzir a meta de inflação futura, o CMN talvez mire pressionar o próximo governo a adotar medidas duras contra o aumento da despesa pública. Mas isso terá de passar, necessariamente, por reformar a Previdência, o funcionalismo e eventualmente aumentar impostos.

Sem isso, podemos apostar: teremos não menos, mas mais inflação.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.