Sempre digo, quando questionada sobre a minha estratégia para analisar o mundo, que sou boa em fazer perguntas. Nem sempre tenho respostas, mas sempre tenho algo a perguntar. Começarei neste espaço, portanto, perguntando.
E, para materializar a troca fundamental que eu estabeleço com quem me acompanha, farei a pergunta que mais escuto: como eles não notam que estão errados?
A resposta, ironias da vida, passa pelo custo de perguntar. Para notar que estou errado, eu preciso admitir essa possibilidade e questionar o senhor das minhas verdades incorporadas. Só que perguntar é admitir a ignorância. Não saber te faz vulnerável. Questionar dá trabalho. Mais fácil, como disse Orwell, no prefácio de “A Revolução dos Bichos”, a “mentalidade de gramofone”: reproduzo sem refletir e sigo seguro nas minhas certezas e convicto do meu poder.
O problema dessa certeza irrefletida é que a “verdade” pode ser moldada de acordo com as vontades de quem as pronuncia, deixando-nos à mercê dos artesãos dos fatos, que, tirando uma coisa ali e acrescentando outra acolá, dão à sua obra o formato desejado.
A única forma de se blindar, insisto, é a dúvida. O pior inimigo das pseudoverdades não são os sábios, são os curiosos, que, ao perguntarem, expõem a preguiça do crente.
Na ridicularização da dúvida mora a vergonha daquele que nem sequer sabe por qual razão acredita no que crê.
Rubem Alves já escreveu que “o voo só acontece se houver o vazio” e que o vazio é “a ausência de certezas”. “Os homens”, diz ele, “querem voar, mas temem o vazio. Não podem viver sem certezas. Por isso, trocam o voo por gaiolas. As gaiolas são o lugar onde as certezas moram.”
Perguntar é a afirmação da liberdade. O voo. É abrir as portas das nossas gaiolas.
Se a verdade liberta, a vergonha da dúvida nos aprisiona cada vez mais.
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