Esses dias escutei uma mulher contando que, durante anos, escondeu o climatério do marido. A revelação se deu de forma tragicômica. Estavam de férias em uma cidade da serra, a temperatura roçando os sete graus. No meio da noite, ela acordou com o típico calorão dessa fase hormonal.
Em poucos segundos, o fogacho se alastrou do peito para o corpo todo, provocando a necessidade urgente de se refrescar. Saiu de baixo do cobertor, tirou a camisola, mas, como o quarto estava aquecido pela calefação, não foi o bastante. Puxou a porta de correr e desceu só de calcinha para o descampado, abrindo os braços para o sereno da noite.
Foi essa cena que o marido viu, logo depois de esfregar os olhos, desperto pelo barulho da porta envidraçada. O que a sua mulher fazia quase nua, às três da manhã, de braços abertos, lá fora?
a) Comungava com a deusa Vênus.
b) Manifestava sonambulismo.
c) Voltava extasiada da cama do vizinho.
d) Buscava o juízo.
Naquele momento, é provável que nenhuma dessas desculpas tenha ocorrido a ela. Ou até tenha, mas ela preferiu contar logo a verdade, já exausta de tanto escondê-la.
O que mais me impressiona nesta história é isso: ela ter escondido o climatério. Como se já não bastasse o sofrimento causado pela natureza, que não sabe quanto evoluímos e trata a mulher que para de ovular como carta fora do baralho, privando-a dos hormônios que lubrificam a vida. Como se já não bastassem os calorões, a insônia, as alterações de humor causadas pela carência de progesterona e estrógeno. Como se já não bastassem a fadiga e a diminuição da libido provocada também pela baixa de testosterona. Como se já não bastassem a perda de memória, de elasticidade da pele, a queda dos cabelos, o aumento de gordura no sangue, a maior probabilidade de ter infarto. Ela ainda achou que deveria passar por todos esses sintomas em silêncio, na solidão dos seus frascos de remédio, fingindo-se de jovem para sempre.
Como diz a minha amiga Dadá Coelho, Deus só pode ser misógino. E a maior prova disso é o climatério. Uma sociedade que dá ao homem um trono para ele envelhecer em paz, cultivando a sua barriga e a sua calvície, e sugere que a mulher esconda o seu envelhecimento é mesmo a imagem e a semelhança da misoginia.
Não precisamos ser assim. Podemos (ou não) amenizar as marcas do tempo com botox e pancake, ludibriar o climatério com reposição hormonal, fazer a quantidade de plásticas que quisermos sem maquiar o fato irrefutável de estar envelhecendo. O fato invejável de estar envelhecendo, porque é verdade: o tempo nos faz melhores onde mais importa, a cabeça. E a outra única opção a envelhecer é a morte.
Portanto, quando um homem achar ruim o passar do tempo para uma mulher, é bom lembrar que o problema não está no passar do tempo. Está no homem. Nas limitações intelectuais e emocionais deste homem. Nesse caso, eu recomendo à mulher que se levante, tire a roupa, abra a porta e corra nua e cheia de tesão para bem longe dali.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.