Gregorio Duvivier

É ator e escritor. Também é um dos criadores do portal de humor Porta dos Fundos.

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Gregorio Duvivier

Lá se vão duzentos anos de homens imbroxáveis broxando

Jair Bolsonaro transformou o Sete de Setembro num evento sobre ereções

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Pensavam que Bolsonaro transformaria o Sete de Setembro num evento sobre eleições, mas acabou sendo sobre ereções. A palavra que ficará marcada no bicentenário da nossa Independência é o neologismo "imbrochável" —ou "imbroxável", como preferir.

Da minha parte, preferido broxar com "x", que remete a interjeições tão broxas, como puxa e pôxa. No entanto faz sentido também a grafia em "ch", aludindo a adjetivos flácidos como murcho e chocho.

Caberia até a grafia em "shhh!", por vir sempre junto com um pedido de sigilo. ("Broshhh!ei.")

Colagem com a bandeira do Brasil mostra Lula saindo de treas dela e Bolsonaro dobrando-se em direção a um buraco em frente.
Ilustração de Catarina Bessell para coluna de Gregório Duvivier 14.set.2022 - Catarina Bessell


Parece inusitado comemorar nosso aniversário trazendo à tona a impotência, mas tem algo de muito brasileiro na evocação do falhanço. Primeiro porque o verbo broxar é coisa nossa. Não se broxa, que eu saiba, em outras línguas. Nem mesmo em Portugal. Por lá, é necessário pegar emprestado verbos menos específicos: vergou, descaiu. Em inglês, diz-se: "Perdi minha ereção", como se fosse um objeto extraviado.

Por aqui não precisamos perder nada. Podemos afirmar a falta de firmeza, como se houvesse dolo: broxei. Trata-se de um verbo sui generis, que descreve um não evento, atribuindo ação àquele que não agiu.

A flacidez está no nosso DNA. A independência, há 200 anos, já foi broxa. Apesar da espada em riste, dom Pedro logo se viu impotente e acabou se exilando do próprio país que tinha criado —envergonhado do próprio fracasso.


Trocamos a dependência de Portugal pela da Inglaterra, o Império broxou e deu lugar a uma república de presidentes broxas. As reformas populares foram broxadas pelos militares e a dita dura terminou de vez com uma bomba explodindo no pinto dos militares no Riocentro.

A redemocratização logo broxou quando morreu Tancredo, depois broxou de novo quando elegemos Collor —que por sua vez broxou, mesmo fazendo uso (dizem) de estimulantes pelo reto. Em 200 anos, foram poucos os momentos em que se viu esse país de cabeça erguida.


No mais, tem algo de paradoxal no neologismo "imbroxável". Só se levanta quem está deitado.
O homem, já dizia Aristóteles, é um animal broxável. Tudo fica mais cômico na boca de Bolsonaro, o sujeito que que não consegue digerir um camarão ou fazer uma flexão corporal, que dirá genital.

Nos dias seguintes à bravata, o imbroxável broxou nas intenções de voto. Hoje, pode perder no primeiro turno. Há quem tenha medo de golpe. Se fizer jus à história, vai ser uma broxada daquelas.

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