Gustavo Alonso

Doutor em história, é autor de 'Cowboys do Asfalto: Música Sertaneja e Modernização Brasileira' e 'Simonal: Quem Não Tem Swing Morre com a Boca Cheia de Formiga'.

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Gustavo Alonso

Rita Lee mostra que é possível duas autobiografias sobre uma só vida

O primeiro livro autobiográfico de compositora é sensacional

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É possível escrever duas autobiografias sobre uma mesma vida? A nossa musa do rock, Rita Lee, prova que sim. Foi anunciado que em 22 de maio próximo será lançado "Rita Lee: outra biografia", pela editora Globo. Rita havia lançado "Rita Lee: uma autobiografia" pela mesma editora em 2016. Não se trata de atualização. É outro livro mesmo.

A cantora Rita Lee
Rita Lee em foto no seu Instagram - @ritalee_oficial no Instagram

Uma vida nunca cabe em um livro. Uma vida é algo passado, sem volta. Uma biografia é um olhar sobre o que já passou. Sem o fetiche da "verdade sobre a vida", tanto melhor será termos o máximo de (auto)biografias possíveis.

Um caso precedente ao de Rita Lee é o de Reinaldo Guarany, militante das esquerdas na luta armada. Em 1978 ele escreveu "Os Fornos Quentes" e em 1983 lançou "A Fuga". Nos dois livros, Guarany nos conta o mesmo período de sua vida: o movimento estudantil, a luta contra a ditadura, a prisão, tortura e exílio. Os mesmos acontecimentos e personagens. Mas duas narrativas bem diferentes. A primeira é tensa e raivosa. A segunda é fluida e leve, cheia de ironia tragicômica e autocrítica.

Assim como Reinaldo Guarany, Rita acena que é possível escrever sobre si de diversos ângulos, revisando antigos momentos. Escrever autobiografias é analisar a si mesmo pelo ângulo do presente. E se o presente mudou, o olhar sobre si próprio também muda.

Desde que escreveu sua primeira autobiografia, a vida de Rita deu algumas reviravoltas. O envelhecimento gradual levou à aposentadoria dos palcos. Em meio ao ocaso da artista, ela enfrentou um agressivo câncer no pulmão. Rita resumiu: "Achei que nada mais tão digno de nota pudesse acontecer em minha vidinha besta. Mas é aquela velha história: enquanto a gente faz planos e acha que sabe de alguma coisa, Deus dá uma risadinha sarcástica".

O primeiro livro autobiográfico de Rita é sensacional. Revelador, íntimo e muito bem escrito, impossível de ser largado pelo leitor, mesmo aquele que não é seu fã. Competente em análises de si e de seus pares, Rita fez uma obra que figura entre as melhores autobiografias musicais do mercado brasileiro.

Será que Rita conseguirá superar-se neste novo livro? Mesmo que a nova obra não seja capaz de rivalizar com o primeiro livro, fica uma dica para os companheiros da música brasileira. É hora das memórias!

Gil ainda não tem uma autobiografia de verdade. A que escreveu em 2013 junto com a jornalista Regina Zappa, "Gilberto de Perto", parece mais um álbum de figurinhas com textos imprecisos e sem densidade. Caetano, por sua vez, poderia nos contar sua vida de 1972 em diante, período não contemplado em seu sensacional "Verdade Tropical". E Chico Buarque? Com tantos livros louvados no campo da literatura, quando nos brindará com suas memórias? E Milton? E Roberto Carlos? E Jorge Ben? E Alceu? E Djavan? E Elba Ramalho? E Chitãozinho & Xororó?

Vanguardista, Rita deu a senha. É possível tantas escritas quantas quisermos. Sorte a nossa.

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