Helio Beltrão

Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

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Helio Beltrão

Os riscos da autonomia do Banco Central

Metas secundárias para o autoridade monetária podem se tornar narrativas

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O presidente Jair Bolsonaro deve sancionar nas próximas semanas a lei que estabelece certo grau de independência ao Banco Central. Independência do que ou de quem? Do governo da vez, ainda que seja uma autonomia limitada. A lei determina que o governo seguirá nomeando a equipe (após dois anos de governo), porém esta terá mandato fixo e não poderá ser demitida, salvo em casos especiais.

Historicamente, governantes ao redor do mundo manejaram o poder de criação de moeda e crédito —portanto de financiar déficits e gerar inflação e ciclos econômicos— a serviço de seus interesses pessoais, em especial antes de eleições.

Particularmente no século 20, essa manipulação do nosso dinheiro financiou aventuras bélicas, estímulos insustentáveis da atividade econômica e a devastação da poupança da população por meio do confisco inflacionário.

A história e a literatura científica confirmam que, quanto mais longe do “botão de imprimir dinheiro” permanecerem políticos, governantes e interesses setoriais, mais responsável será a gestão monetária, e, consequentemente, maiores serão renda e emprego.

O Bundesbank, criado na década de 1950, nasceu já independente pela liderança de Ludwig Erhard, que insistiu em que melhor cumpriria o mandato de estabilidade de preços se fosse protegido do controle político.

As décadas de 1960 e 1970 foram sombrias para a ciência econômica: acreditava-se que o governo poderia gerar mais crescimento por meio de mais inflação. Era justamente o que os políticos queriam ouvir dos economistas.

Nos EUA, o governo engajou-se na guerra contra a pobreza e na Guerra do Vietnã com armamento monetário criado do nada. Perdeu as duas. Tentou sair da crise criando mais dinheiro e jogou a culpa da inflação galopante nos árabes e no petróleo. Só saiu da crise jogando sua Selic para 15% por período prolongado.

Em contraste, os independentes Bundesbank e o Swiss National Bank mantinham a inflação razoavelmente controlada.

Quem viveu os anos 1970 e 1980 aprendeu a duras penas a lição de que não se pode confiar nosso dinheiro a políticos. Mas o principal aprendizado foi em boa medida desaprendido: quem mais perde com a inflação é o pequeno.

Atualmente, no mundo, tem prosperado a pressão para que se crie mais moeda e assim permitir que o governo incorra em mais déficits. Apontam para o índice oficial de inflação comportado.

Mas bens relevantes ao pequeno poupador, não capturados pelo índice, estão ficando cada vez mais inacessíveis, como imóveis e outros ativos de risco. Nunca foi tão difícil ao entrante no mercado de trabalho nos grandes centros urbanos obter sua casa própria.

A independência do BC é bem-vinda por representar um avanço, mas não é panaceia. A lei introduziu perigosas e subjetivas metas secundárias, como as de garantir a estabilidade do sistema financeiro, gerir o ciclo econômico e fomentar o pleno emprego. Já é difícil conter pressões externas e tentações internas com uma única meta clara (a do IPCA), que dirá com metas múltiplas, que serão mais questão de narrativa do que números objetivos.

É importante alertar para o fato de que um BC com autonomia permanece sujeito a sucumbir a interesses, como demonstra a teoria da captura regulatória.

A independência a almejar no futuro é entre nosso dinheiro e qualquer órgão monopolista capaz de criar moeda do nada. O êxito do bitcoin atesta que muitos desejam uma alternativa ao sistema atual.

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