Framings (enquadramentos) são tudo —e podem valer bilhões de dólares. O(s) ataque(s) às Torres Gêmeas no dia 11 de setembro de 2001 foi (foram) um ou dois eventos? Se foi um, as seguradoras teriam de pagar US$ 3,55 bilhões aos donos dos prédios. Se foram dois, então o valor devido passaria a US$ 7,1 bilhões. A disputa, que terminou num acordo de US$ 4,55 bilhões, ilustra bem o poder dos framings: o modo como escolhemos definir o problema determina a resposta.
O STF deparou com uma questão semelhante na semana passada, no julgamento do dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que permite reduzir a jornada de trabalho e o pagamento feito a servidores públicos em momentos de ajuste de gastos com pessoal. O juízo ainda não foi concluído, mas já há maioria para sustentar o entendimento de que, como os salários são constitucionalmente irredutíveis, o mecanismo tem de ser invalidado.
O que, afinal, é o salário? O montante de dinheiro que o trabalhador leva para casa no fim do mês ou o valor recebido por unidade de tempo em que ele fica à disposição do empregador? Na primeira hipótese, o dispositivo de fato fere o princípio da irredutibilidade do salário; na segunda, temos apenas uma redução da jornada, o que não é vetado pela Carta.
Os entusiastas da provável decisão do STF irão descrevê-la como uma vitória das proteções trabalhistas contra o neoliberalismo. Pode ser, mas a própria noção de proteção comporta diferentes framings.
Não há dúvida de que, no curto prazo, servidores tiveram seus rendimentos preservados. Mas, se a crise dos estados se agravar, não ter reduzido a jornada enquanto ainda era tempo pode desencadear uma situação ainda pior, em que parte dos servidores acabe exonerada, conforme previsão da própria Constituição (art. 169) no caso de descumprimento dos limites de gasto com pessoal.
Cuidado com os framings que você escolhe.
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