Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Hélio Schwartsman

Jesus era gay?

Caráter subversivo justifica que não existam barreiras para o humor

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Embora não chegue aos pés de “A Vida de Brian”, produção de 1979 do grupo inglês Monty Python, na qual se inspira, “A Primeira Tentação de Cristo”, o especial natalino da trupe Porta dos Fundos, disponível na Netflix, é divertido e traz algumas boas piadas. O tom geral é de deboche. Deus é retratado como um tarado sacana, Maria é meio safadinha, e Jesus vive um tórrido romance homoerótico com Satanás.

Religiosos, como era de esperar, não gostaram e deram início a uma campanha em que pedem algo entre o boicote e a censura ao filme. Deve haver limites para o humor? Vale esculhambar a religião alheia? E piadas racistas, sexistas ou homofóbicas?

Cena do especial de natal da Netflix 'A Primeira Tentação de Cristo', feita pelo grupo Porta dos Fundos
Gregorio Duvivier (dir.) e Fábio Porchat em cena de 'A Primeira Tentação de Cristo' - Divulgação

Eu sempre defendi uma liberdade de expressão forte —ninguém precisa de licença para dizer o que todos querem ouvir— e penso que ela deve ser ainda maior quando se trata do humor. Ao instituir uma lógica em que a brincadeira e o sério convivem, em que as coisas podem ser sem ser para valer, o humor funda uma ontologia própria, que tem profundas repercussões sociais.

Ele pode atuar como uma força a serviço do conformismo. Como observou Henri Bergson, o medo de tornar-se objeto do riso de outros faz com que o indivíduo reprima ele próprio suas excentricidades. A sociedade ganha em coesão, mas perde em diversidade.

Só que o humor também pode ser profundamente revolucionário. O jogo do “é, mas não é de verdade” permite que as pessoas sondem umas às outras e, sem se comprometer em demasia, desafiem o statu quo. As piadas sobre as agruras do socialismo no Leste Europeu, por exemplo, criavam situações em que os cidadãos conseguiam exprimir seu descontentamento com o regime sem correr grandes riscos. Tiveram papel importante na derrocada das ditaduras comunistas.

Esse caráter subversivo, que põe continuamente à prova os consensos sociais, é valioso o bastante para justificar que não existam barreiras para o humor.
 

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.