Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Hélio Schwartsman

Um bicho igualitário

Sociedades em que nossa espécie foi forjada nunca toleraram bem a tirania

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Todos nos revoltamos com a cena do desembargador prepotente tentando humilhar o guarda civil santista que cumpria seu dever. Por quê?

A cultura do você-sabe-com-quem-está-falando ofende nossos pendores igualitários, particularmente a noção de que a lei vale para todos. Sim, apesar da grande dispersão nos índices de distribuição de riqueza, o ser humano é um bicho igualitário, muito mais do que os rígidos chimpanzés e até do que os mais relaxados bonobos.

Autores como Christopher Boehm e Richard Wrangham mostram de forma convincente que um dos processos fundadores da humanidade foi a autodomesticação. As sociedades de caçadores-coletores em que nossa espécie foi forjada nunca toleraram bem a tirania. Seus membros não hesitavam em formar alianças para destronar qualquer macho alfa que pretendesse virar dono do pedaço.

Desembargador Eduardo Siqueira rasga multa por estar sem máscara em praia de Santos (SP)
Desembargador Eduardo Siqueira rasga multa que recebeu por estar sem máscara em praia de Santos (SP) - Reprodução TV Tribuna

O objetivo inicial provavelmente era algo modesto, como garantir que a carne obtida nas caçadas fosse dividida de forma justa, mas a dinâmica produziu uma série de efeitos colaterais. De um lado, valentões incorrigíveis e psicopatas foram eliminados fisicamente —e seus genes excluídos do pool da humanidade. De outro, indivíduos com pendores dominantes aprenderam a exercer o autocontrole. Desse processo teriam surgido não apenas nossa consciência moral como a nossa incrível capacidade de colaborar uns com os outros.

Se somos assim tão igualitários, como explicar a existência de tantas monarquias e castas sociais? Com o advento da agricultura, as sociedades se tornaram bem maiores e mais complexas, o que requeria um comando mais centralizado. Foi aí que inventamos os reis e ressignificamos a hierarquia. Mas o impulso igualitário nunca foi esquecido, tanto que, mais tarde, acabamos criando a República, democratizamos monarquias e, mais importante, nos preocupamos com a desigualdade —algo que nunca ocorreria a um chimpanzé.

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