Em casa de ferreiro o espeto é de pau. O ditado popular serve à perfeição para descrever a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A organização, que prestou e ainda presta inestimáveis serviços à democracia brasileira, exibe, no plano interno, regras muito pouco democráticas, para não dizer autoritárias.
Como venho escrevendo aqui há tempos, a democracia interna da OAB lembra mais a do Partido Comunista da Mongólia do que a de uma entidade afeita ao "Zeitgeist" do século 21. A eleição para os cargos mais importantes é indireta e sob vara (com voto obrigatório). Qualquer advogado pode ser obrigado a assumir cargos na ordem, mesmo que não queira.
Pior, o Conselho Federal ignora solenemente o princípio do "um homem, um voto" e emula a estrutura do Senado, onde todos os estados têm igual peso, muito embora Roraima tenha 2.241 advogados inscritos, e São Paulo, 326.218.
Foi com grata satisfação, portanto, que li na Folha que um grupo de advogados finalmente se rebelou contra essa situação e lançou o movimento "Quero Diretas na OAB", que conta com o apoio de figuras importantes dentro da própria organização, o que permite supor que as chances de mudança sejam reais.
Minha alegria, porém, durou pouco. Ao final da reportagem, o atual presidente da OAB nacional, Felipe Santa Cruz, que se diz favorável ao movimento, afirma categoricamente ser contrário ao modelo "um inscrito, um voto". Eu receio que Santa Cruz aqui demonstre mais lealdade para com o sistema federativo que o elegeu do que para com os princípios republicanos e democráticos que deveriam orientar as mudanças.
O fato básico é que não existe nenhuma boa razão para a ordem reproduzir a estrutura do Senado e não a da Câmara, onde, em teoria, todos os cidadãos estão igualmente representados. Não vejo que especificidades locais possam justificar que um advogado de Roraima valha por 146 de São Paulo.
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