A novidade com que me deparo ao voltar de férias é ver Nicolás Maduro recorrendo a um dos truques mais velhos do mundo para agarrar-se ao poder, que é desencavar uma pauta nacionalista qualquer, transformá-la num "casus belli" contra algum vizinho e tentar transformar isso em apoio popular.
Até pode funcionar. O nacionalismo é um dos pontos fracos da nossa espécie. Quando os militares argentinos fabricaram uma manobra dessas em 1982, ao investir contra as Malvinas, conseguiram a façanha de fazer com que boa parte da esquerda platina, cujos integrantes vinham por eles sendo perseguidos e assassinados, os apoiasse na aventura. Há, obviamente, riscos. Como demonstra o caso argentino, os ditadores foram às vias de fato, perderam e foram defenestrados.
Mesmo quando o governante é mais hábil e circunscreve os brios nacionalistas ao reino da fantasia, sem se expor a uma guerra de verdade, a estratégia só funciona por um tempo, já que os problemas econômicos e políticos que o haviam colocado em dificuldades não desaparecem. São no máximo momentaneamente suspensos. Se o timing for bem calculado, pode ser o suficiente para vencer uma eleição —ou criar um pretexto para adiá-la.
Quem deve estar espumando de raiva com Maduro é Lula. O brasileiro foi muito além do que seria prudente ao readmitir o venezuelano no círculo da normalidade política subcontinental e se viu apunhalado pelas costas. A pantomima de Maduro cria uma dificuldade real para o petista. Se, em relação às guerras na Ucrânia e em Gaza, Lula podia portar-se como um franco-atirador, disparando opiniões desinformadas, porque ninguém o levaria muito a sério mesmo, agora ele se vê diante de um potencial conflito bélico em que a geografia o unge como mediador natural. É uma situação à qual não tem como escapar e em que suas ações têm peso. Vamos torcer para que se saia bem. A estabilidade regional depende disso.
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