Hélio Schwartsman

Jornalista, foi editor de Opinião. É autor de "Pensando Bem…".

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Hélio Schwartsman

Cidadãs de segunda

Equiparação de nascituros a bebês traz risco de rebaixamento jurídico das mulheres

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São Paulo

Até acho que a lei deve operar com tempos gestacionais para regular o aborto. A interrupção da gravidez deve ser decisão exclusiva da mulher até mais ou menos a metade da gestação e, depois disso, só poderia ocorrer por uma boa razão médica (riscos à saúde da mãe, malformações graves) ou jurídica (estupro, incesto). Em nenhum caso, porém, penso que se possa equiparar proteções legais ao nascituro aos direitos de uma pessoa já nascida, que é a lógica por trás do famigerado PL Antiaborto por Estupro e de outras propostas legislativas como o ainda mais aberrante Estatuto do Nascituro.

Se essa ideia for entronizada no arcabouço jurídico brasileiro, mulheres, mesmo aquelas radicalmente carolas, que jamais fariam um aborto, estariam com seus direitos ameaçados, tornando-se cidadãs de segunda categoria. Eu explico. Hoje não há leis que impeçam grávidas de praticar atividades perigosas.

Grupo de mulheres pró-aborto fazem protesto em frente ao STF - Pedro Ladeira/Folhapress - Pedro Ladeira/Folhapress

Uma gestante pode, se quiser, saltar de paraglider ou tentar a travessia do cabo Horn a nado. Tampouco existem normas que obriguem gestantes a abster-se de comportamentos nocivos à saúde do nascituro, como fumar, drogar-se ou tomar porres diários.

Se a tese de que fetos têm os mesmos direitos de bebês for aceita, é uma questão de tempo até que a bancada evangélica crie várias leis de teor proibicionista. E talvez nem seja necessário. Membros mais amalucados do Ministério Público (material de que nunca há falta) poderiam em princípio, com base na legislação já existente, processar grávidas mais valentes ou dependentes. Até a gestante que não segue a recomendação do obstetra de repouso absoluto poderia ser posta a ferros.

É claro que a maioria das grávidas já evita comportamentos que impliquem riscos ao nascituro. Mas existe uma grande diferença entre fazer algo voluntariamente ou por determinação de terceiros. O que se sacrifica na passagem de um para outro é nada menos do que a autonomia da mulher.

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