A China quer facilitar a concessão de vistos no desembarque, ampliando um programa-piloto que permitia a turistas em trânsito permanecer em cidades selecionadas por até 72 horas sem autorização adicional.
Esse movimento visa principalmente a viajantes de negócios que desejam evitar a burocracia das autorizações regulares, numa medida que tenta impulsionar a economia enfraquecida, embora não resolva o problema principal: o declínio do interesse de estrangeiros em visitar o país asiático.
Até 2019, a China continental recebia 30 milhões de turistas estrangeiros por ano. Com a Covid e quase três anos de fronteiras fechadas, a cifra de visitantes internacionais caiu drasticamente. A proibição dos vistos de turismo e a burocracia relacionada à entrada no país reduziram o turismo com força.
Os primeiros sinais de recuperação apareceram em janeiro, quando a normalização das viagens de lazer e a permissão de entrada para estrangeiros aumentaram em 59% as buscas por voos para a China, de acordo com dados de um popular buscador de passagens online. Mas o otimismo foi breve.
No primeiro trimestre deste ano, 50 mil pessoas visitaram a China por meio de grupos organizados por agências de viagens, bem longe dos 3,7 milhões no mesmo período pré-pandemia. O Wall Street Journal estimou que Pequim e Xangai atraíram até agora menos de um quarto do que recebiam antes da Covid.
A cobertura negativa da China na mídia ocidental, as ações arbitrárias em Pequim e as políticas dos governos ocidentais reforçaram a imagem negativa do país. Em 2018, a China deteve os canadenses Michael Spavor e Michael Kovrig e os manteve como reféns até o Canadá libertar Meng Wanzhou, filha do fundador da Huawei, presa a pedido dos EUA por supostamente violar sanções impostas ao Irã.
Em agosto de 2020, Cheng Lei, uma jornalista chinesa naturalizada australiana, foi presa porque teria fornecido "segredos de Estado a uma organização ou um indivíduo no exterior" —ela ainda está detida.
Ambos os casos se somam a centenas de outros episódios que envolvem cidadãos americanos e europeus, na maioria das vezes de ascendência chinesa, impedidos de sair do país após entrarem como turistas, mesmo que contra eles não pese nenhuma investigação ou procedimento criminal em curso.
A situação fez o Departamento de Estado emitir em junho uma nota aconselhando americanos a evitar viagens à China devido ao risco de "aplicação arbitrária das leis locais" e "risco de prisões indevidas".
Pequim está ciente do quanto perde com a redução de turistas, mas não parece muito inclinada a mudar de postura. Até há investimentos em propaganda para rebater as acusações e culpar os EUA pela imagem negativa, mas em suma o país segue com prisões arbitrárias e, mais recentemente, aprovou uma legislação que premia com dinheiro os chineses que denunciarem um espião estrangeiro.
Decidir se há base ou não para a acusação ficará a cargo de um sistema que não é exatamente conhecido pela transparência ou independência entre os Poderes.
O turista médio foi então pego em cheio pela narrativa de um país com leis autoritárias e que prende estrangeiros para obter vantagens políticas. É um cenário perigoso por várias razões —menos turismo significa menos oportunidades de entendimento mútuo e cooperação, prejuízos a uma economia local que vacila e aumento na animosidade geral entre chineses e ocidentais.
Sintomático que, num dia desses, ao comentar a uma amiga americana que eu pretendo visitar Pequim ainda neste ano, ela não tenha me desejado "boa viagem", mas que eu "permanecesse seguro".
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