Igor Patrick

Jornalista, mestre em Estudos da China pela Academia Yenching (Universidade de Pequim) e em Assuntos Globais pela Universidade Tsinghua

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Descrição de chapéu Governo Biden China

Xi Jinping caminha por campo minado para se encontrar com Joe Biden

Apec deste ano virou apenas plano de fundo bonito para a reunião que realmente importa entre os dois líderes

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Agora é oficial. Depois de semanas de silêncio, Xi Jinping confirmou que estará nos Estados Unidos na semana que vem para a cúpula de membros da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec, na sigla em inglês) e deve se encontrar com Joe Biden para a primeira reunião bilateral dos dois em solo americano desde que o democrata chegou à Presidência.

A Apec pode ser pouco conhecida no Brasil, mas tem importância central na agenda político-econômica de seus 21 membros. Juntos, os países que integram o fórum representam 40% de toda a população mundial e cerca de 50% de todo o PIB global. O encontro de líderes, realizado anualmente, é o momento de destravar acordos, promover o comércio e atrair investimentos.

Xi Jinping e Joe Biden em encontro bilateral na cúpula do G20, em novembro de 2022, na Indonésia
Xi Jinping e Joe Biden em encontro bilateral na cúpula do G20, em novembro de 2022, na Indonésia - Saul Leob - 14.nov.22/AFP

Nada disso importará tanto em 2023, claro. Tanto Pequim quanto Washington reconhecem que chegaram próximo do fundo do poço nas suas relações diplomáticas. Há pouquíssimas coisas em que EUA e China concordam hoje em dia, e mesmo o que deveria ser óbvio, como a promoção do comércio ou o combate às mudanças climáticas, perdeu-se em uma miríade de crises, declarações truncadas e retórica belicista que impedem quaisquer tentativas de aproximação.

A Apec deste ano virou apenas um plano de fundo bonito para a reunião que realmente importa, entre Biden e Xi. Para o líder chinês, a decisão de visitar "território inimigo" pela primeira vez em oito anos carrega significativo risco político, e ele precisa se certificar de obter concessões do homólogo americano a fim de justificar sua presença para a audiência doméstica cada vez mais nacionalista.

Xi caminha por um campo minado. A deterioração dos laços chegou a um nível tão delicado que agora parece haver consenso sobre a necessidade de "estabilizar a relação". Esta talvez seja a última oportunidade de fazê-lo no primeiro mandato de Biden, já que a retórica anti-China vai aumentar com a campanha eleitoral americana em 2024 e as eleições presidenciais em Taiwan marcadas para janeiro.

Os dois lados precisarão encontrar salvaguardas e consensos para evitar que desentendimentos coloquem suas forças militares em rota de colisão. Oficiais seniores envolvidos na preparação da visita me disseram que o mundo pode esperar acordos para impedir o uso de inteligência artificial para fins militares (como gestão de armas nucleares ou condução de drones), a restauração dos canais de comunicação entre as Forças Armadas, políticas para pesquisas conjuntas em saúde, combate às mudanças climáticas e o aumento de voos diários entre os dois países —que nunca voltaram ao nível pré-pandemia.

Ainda há pontos a serem finalizados acerca da linguagem em torno dos conflitos de Israel e Ucrânia, e Pequim também se mostrou interessada em cooperar no desenho de políticas públicas de proteção aos trabalhadores, iniciativa criada por Lula e Biden às margens da Assembleia-Geral da ONU neste ano.

Além dos compromissos diplomáticos, Xi também janta na quarta (15) com empresários americanos, em uma tentativa de reverter a má impressão de empresários sobre a trajetória econômica chinesa. A despeito da queda recorde no volume de investimento estrangeiro direto na China nos últimos meses e os sinais de forte desaceleração na agenda de reformas, o evento atraiu alta procura até aqui.

Os ingressos, vendidos apenas a convidados por valores entre US$ 2.000 e US$ 40 mil, esgotaram-se rapidamente —teve magnata em Wall Street que não conseguiu cadeira. Organizadores dizem que Xi fará "um grande e importante discurso" na ocasião, e quem pagou tão caro espera ouvir renovado apoio à esquecida agenda de reformas.

Mantenhamos o pragmatismo, contudo. A relação entre Estados Unidos e China dificilmente voltará aos níveis de cooperação vistos no início do século, mas para o bem de ambos os países e do planeta, seria bom que os respectivos líderes voltassem a conversar como adultos e prevenissem uma catástrofe.

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