Ilona Szabó de Carvalho

Presidente do Instituto Igarapé, membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral. da ONU, e mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia)

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Ilona Szabó de Carvalho

A democracia reage

A marcha da retomada do espaço cívico precisa continuar

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Após 18 meses da presidência de Jair Bolsonaro, instituições da República, imprensa e sociedade conseguem colocar em marcha ações simultâneas e contundentes em defesa do Estado Democrático de Direito. E como resultado, o presidente e seu núcleo duro ideológico, pela primeira vez desde o início do governo, deram sinais de que se sentiram acuados e recuaram por iniciativa própria.

A possível nomeação de um ministro da Educação fora do domínio dos olavistas, a revogação de medida provisória que dava ao cargo a prerrogativa de designar reitores, e da portaria que acabava com incentivo a cotas para negros, indígenas e pessoas com deficiência na pós-graduação são alguns exemplos de recuo. O discurso relacionado ao Judiciário e ao Legislativo passou do tradicional tom bélico para um mais conciliador.​

Até o início de 2020, representantes de instituições da República ainda apostavam que notas de repúdio poderiam causar mudança de rumo. Mas viram que elas nem sequer causaram constrangimento. Boa parte da imprensa foi mais ágil em subir o tom e começou a classificar corretamente o governo como de extrema direita ao ser atacada frontalmente. A tentativa do uso da renovação de concessões como instrumento de intimidação e as agressões sofridas por repórteres em coletivas ou manifestações contribuíram para um posicionamento cada vez mais assertivo.

Organizações da sociedade civil, que, desde a campanha, apontavam para os riscos do discurso e das propostas antidemocráticas de Bolsonaro e seus filhos, sofreram muitos ataques e focaram inicialmente em organizar a reação, sem conseguir pautar o debate. Focaram em acompanhar uma avalanche de normas infralegais que corroem legislações e instituições por dentro para contestá-las no debate público e legalmente.

Mas o vento mudou. Alguns freios vigorosos aos impulsos autoritários do Executivo federal finalmente trouxeram certo alívio. O STF agiu em tentativas de intervenção na Polícia Federal e vem conduzindo investigações ligadas à rede de fake news e aos ataques feitos à própria Corte. Terá a chance também de decidir sobre o foro privilegiado de Flávio Bolsonaro, cuja prisão do ex-assessor Fabrício Queiroz demonstrou que tentativas de barrar apurações podem ter retardado investigações de acusações graves, mas não as mataram.

A imprensa e organizações da sociedade civil conseguiram incentivar e apoiar ações, tanto das instituições como da população. A sociedade civil se uniu e viu o número de iniciativas contra o viés autoritário do governo se multiplicar. Surgiram, nos últimos meses, as hashtags Mulheres Derrubam Bolsonaro e Somos70porcento, os movimentos Estamos Juntos, Direitos Já e Brasil pela Democracia, e o manifesto Enquanto Houver Racismo, Não Haverá Democracia.

É certo que as forças democráticas se organizaram e agora reagem. Mas o necessário otimismo não pode nos iludir ou desmobilizar. Esse governo já mostrou ao que veio. As ameaças continuam presentes e a promoção do caos pode voltar a qualquer momento. Ademais, estragos significativos em diversas áreas já foram e continuarão sendo feitos.

Como cidadã, alvo de ataques e defensora da democracia, digo: sociedade, imprensa e instituições haverão de continuar a marcha da retomada do espaço cívico e do fortalecimento democrático. As inúmeras investigações sobre os possíveis crimes cometidos pelo presidente e seus filhos haverão de seguir. As acusações confirmadas por provas, haverão de ter consequências. A hora é de unir esforços, consolidar e ampliar os avanços.

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