Jaime Spitzcovsky

Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e Pequim.

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Trinta anos após queda do Muro de Berlim, polarização envelhecida ainda domina debates

Engana-se, porém, quem aposta no embate entre esquerda e direita para achar respostas a desafios do século 21

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Trinta anos após a queda do Muro de Berlim, ocorrida a 9 de novembro de 1989, debates ideológicos resgatam a polarização excessiva responsável por delinear a bipolaridade da Guerra Fria.

Retornou, com intensidade, o embate clássico das cartilhas de esquerda e de direita, depois de, entre os anos 1990 e 2009, várias experiências terem tentado aproximar os polos ideológicos, com fortalecimento das chamadas posições centristas. 

Em outras palavras: desde a crise financeira internacional, no final da década passada, ressurgiu a radicalização do debate entre esquerda e direita.

Enfraqueceram-se iniciativas de amalgamar visões ideológicas concorrentes. Desbotaram arquiteturas de construção de agendas consensuais. 

No imediato pós-Guerra Fria, uma onda de euforia se espalhou. O fim da bipolaridade comunismo-capitalismo alimentou a ideia da prevalência de cenário modelado por expansão da democracia, processos de paz em conflitos regionais e disputas impulsionadas pela conquista não de esferas de influência ideológica, mas de mercados.

Saudou-se o advento da globalização. No campo político, momentos históricos. A África do Sul livrou-se do apartheid. Católicos e protestantes da Irlanda do Norte assinaram acordo de paz. Israelenses e palestinos embarcaram no processo de Oslo, posteriormente fracassado. 

Proliferaram, na arena econômica, processos de integração, com objetivo de aumentar a competitividade por meio da união de países. Nasceu, por exemplo, o Mercosul, enquanto, no velho continente, a União Europeia avançou. 

As duas primeiras décadas do mundo pós-Guerra Fria (1989-2009) testemunharam iniciativas de convergência ao centro do espectro político. Diferenças entre esquerda e direita minguaram. 

Diante da debacle soviética e da adoção, pela China comunista, de mecanismos de economia de mercado, forças políticas à esquerda abandonaram a rejeição dogmática a conceitos como privatização e abertura comercial.

Grupos conservadores, acompanhando a tendência de revisões ideológicas, passaram a enfatizar discursos sociais. 

O presidente George W. Bush (2001-2009), por exemplo, fez do “conservadorismo com compaixão” uma relevante bandeira na sua primeira campanha presidencial, na disputa com Al Gore, ex-vice de Bill Clinton.

Se os republicanos passaram a alardear políticas sociais, os democratas encamparam teses econômicas antes desprezadas, como estímulo a concorrência e a privatizações.

Na Casa Branca, Bill Clinton (1993-2001) se tornou um dos ícones do “movimento da terceira via”, quando arautos da maior intervenção estatal na economia abraçaram visões liberais. 

O time da “terceira via” reuniu, entre outros, o tucano Fernando Henrique Cardoso, o social-democrata alemão Gerhard Schroeder e o trabalhista britânico Tony Blair. 

No entanto, a crise financeira internacional de 2009 implodiu a euforia com a globalização. Despontaram desequilíbrios, como empobrecimento de setores da classe média norte-americana e europeia, cujos empregos e renda migraram para países asiáticos. 

Com aumento de tensões sociais, as cartilhas ideológicas clássicas e a polarização à la Guerra Fria ressurgiram com força.

Engana-se, porém, quem aposta no embate empoeirado entre esquerda e direita para achar respostas a desafios do século 21, como mudanças climáticas e no mercado de trabalho, impactos da inteligência artificial, entre outros. 

É o momento, 30 anos após a queda do Muro de Berlim, de construir um debate ideológico capaz de responder às alterações em curso, e não a padrões de um momento histórico superado.

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