Jaime Spitzcovsky

Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e Pequim.

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Descrição de chapéu África

Hamas faz guerra contra acordos de paz de Israel com países árabes

Grupo islâmico tenta minar tratados, mas diálogo resiste ao ciclo de violência

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Após 11 dias de sangrento e trágico enfrentamento com Israel, o Hamas evidenciou os objetivos políticos de curto prazo. Em discurso no Qatar, seu líder Ismail Haniyeh, exaltou o suposto “fim do processo de normalização e coexistência”, em referência aos acordos de paz assinados em 2020 entre israelenses e Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Marrocos e Sudão.

Chamados de Acordos de Abraão, os tratados constituem o mais importante avanço, em décadas, na busca pelo fim do conflito entre árabes e israelenses. A ofensiva diplomática também provocou terremotos políticos no Oriente Médio, ao deixar de condicionar diálogo com Israel a iniciativas na busca por um Estado palestino.

A partir de 1948, lideranças no Cairo, Damasco ou Bagdá passaram a disseminar a narrativa de que a independência de Israel, viabilizada pela resolução 181 da ONU, correspondia “à maior catástrofe do mundo árabe” no século 20. A questão palestina se tornou, na retórica política, tema central das máquinas de propaganda de regimes autoritários do Oriente Médio.

Líderes como o egípcio Gamal Abdel Nasser ou o sírio Hafez al-Assad usavam a luta contra Israel para mobilizar suas populações e obviamente evitar debates sobre temas domésticos, como ausência de liberdades individuais ou economias ineficientes.

No entanto, com o advento do século 21, a lógica começou a se alterar. Perda de relevância do petróleo e necessidade de construir economias mais modernas e tecnológicas, aliadas à preocupação com expansionismo de rivais como Irã e Turquia, levaram países árabes a rever os laços com Israel.

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Vieram então os Acordos de Abraão, passo relevante na ideia de transformar uma amarga e sangrenta disputa num ciclo de cooperação em áreas como defesa e economia, entre outras. E, além dos quatro signatários do ano passado, importante ressaltar acordos de paz anteriores, assinados por Israel com Egito (1979) e Jordânia (1994).

Ao apostar na escalada da violência, com disparo de mísseis contra Jerusalém em 10 de maio, o Hamas buscava uma lista de objetivos políticos não limitados a minar os Acordos de Abraão. O grupo, reinante de forma ditatorial na Faixa de Gaza, desejava também demonstrar força e enfraquecer seu rival palestino, o Fatah, predominante na Cisjordânia e responsável por diálogos com Israel.

A disputa entre os maiores grupos palestinos atingiu seu ápice em 2007, quando o Hamas, numa guerra civil, expulsou o Fatah da Faixa da Gaza. Ao cantar vitória no discurso do Qatar, Ismail Haniyeh busca também enfraquecer a imagem de Mahmoud Abbas, líder na Cisjordânia, enfraquecido por acusações de corrupção e de ineficiência.

Signatários árabes dos Acordos de Abraão não escondem impaciência e decepção com a liderança palestina, dividida entre o radicalismo pró-Irã do Hamas e o enfraquecimento político da ala veterana no comando do Fatah. No conflito recente, os países que assinaram o tratados de paz em 2020 criticaram Israel, mas não colocaram em xeque as recentes iniciativas de diálogo.

Yousef Al Otaiba, embaixador dos Emirados em Washington, descreveu, em fevereiro, os Acordos de Abraão como estratégia capaz de manter viável a solução de dois Estados, um judeu e um palestino, lado a lado. O diplomata tem razão.

Ao avançar a interação entre Israel e o mundo árabe, aumentam as chances de um cenário de negociação. E os Acordos de Abraão, apoiados em pilares sólidos, vão sobreviver aos desafios colocados por Hamas e Irã, refratários a um cenário de normalização e de coexistência.

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