O universo e a estupidez: duas coisas que parecem infinitas. E segundo Einstein, ainda não temos provas conclusivas sobre a imensidão do primeiro.
Eu me lembrei do velho cientista quando, no rescaldo do debate Trump versus Biden (uso “debate” no sentido caridoso; aquilo foi uma mistura de circo com briga de rua), soube que Quinn Simmons foi afastado pela sua equipe por ter publicado nas redes sociais uma mensagem pró-Trump.
Se o leitor não conhece o jovem Simmons, digamos apenas isso, é uma das grandes promessas do ciclismo americano, talvez o próximo Lance Armstrong (sem as drogas, esperemos). Ou era?
Tanto faz. O meu ponto não é esportivo; é político. Desprezo qualquer pessoa ou instituição que use o seu poder para limitar a liberdade de expressão de alguém.
Mas desprezo ainda mais qualquer pessoa ou instituição que não aprende com a estupidez do passado: será preciso lembrar que a demonização dos apoiadores de Trump foi uma das causas da sua vitória em 2016?
Por outras palavras: permanece a crença, assaz primitiva, de que insultando ou punindo os apoiadores de Trump eles se sentirão coagidos a não votar em semelhante ogro.
Na realidade, aquilo que o clima persecutório produz são falsas enquetes e verdadeiras surpresas na noite eleitoral. As pessoas até podem sentir medo em revelar a terceiros as suas preferências políticas. Mas, na solidão da cabine, a pressão desaparece —e a vingança acontece.
Isso pode suceder no pleito deste ano. Matthew Goodwin, coautor do melhor livro sobre o fenômeno populista que já li (e sobre o qual escrevi: “National Populism: The Revolt Against Liberal Democracy”), publicou recentemente um artigo na UnHerd que merece um minuto de pausa para reflexão.
Sim, Goodwin espera que Donald Trump perca e as enquetes parecem otimistas: Joe Biden lidera em todo o país e, mais importante ainda, lidera em vários estados decisivos.
Além disso, Biden também conquista a simpatia das mulheres, dos americanos com educação universitária, dos millennials, dos hispânicos, dos latinos, dos negros —e, pormenor importante, dos aposentados.
Mas o autor não esquece as lições de 2016. Primeiro, é preciso perguntar se as pessoas não estarão a mentir, guardando as suas reais preferências para as urnas.
E depois, é preciso lembrar que o nível de entusiasmo que os democratas e os republicanos têm pelos seus candidatos é radicalmente distinto.
Entre os democratas, o entusiasmo por Biden ronda os 40%; a nível nacional, ronda os 20%. (Quatro anos atrás, Hillary Clinton tinha 41% e 19%, respetivamente.)
Entre os republicanos, é a loucura: 78% adoram o deus Donald (e, a nível nacional, o fanfarrão consegue entusiasmar um terço dos americanos).
Fato: talvez nessa eleição a questão principal não seja o entusiasmo, mas a repulsa. E, nesse quesito, a repulsa por Trump é maior.
Mas o ponto de Matthew Goodwin é que isso pode valer pouco quando, na hora de votar, são os entusiastas que votam mais.
Nas próximas cinco semanas, a corrida presidencial americana vai descer a níveis impensáveis de mentira, violência e sujidade. E é provável que, do lado democrata, haja a terrível tentação de ressuscitar o tema da “cesta de deploráveis”, que tão bons frutos deu com Hillary Clinton.
Se os democratas retornarem a esse lugar do crime, serão mais quatro anos de Donald Trump.
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