José Henrique Mariante

Engenheiro e jornalista, foi repórter, correspondente, editor e secretário de Redação na Folha, onde trabalha desde 1991. É ombudsman

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Folha, de repente, vira Folhão

Concorrente adota impresso menor e se prepara para disputa de cisnes

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Houve tempo em que a Folha pretendia ser o Folhão. Além da mudança de gênero, uma maciça campanha publicitária tentava forçar o aumentativo que sempre foi prerrogativa de seu principal rival em São Paulo, o Estadão. A ideia era mostrar já no nome que a Folha era o maior jornal do país. Tempos de fascículos, rodagens históricas e muito papel.

Décadas e uma revolução digital mais tarde, a Folha continua a Folha, e o Estadão, o Estadão. A primeira dizendo-se líder nacional, título ora contestado por O Globo, o segundo nomeando-se líder na capital paulista. Folhão, por alguns anos, restou como apelido de um boteco que ficava aberto até a madrugada em frente ao prédio do jornal.

Desde o último domingo (17), no entanto, é possível reviver o slogan com os dois impressos na mão: a Folha, em formato standard, virou um Folhão perto de um Estadinho. Brincadeira à parte, um Estado com páginas 30% menores.

O produto do concorrente não é um tabloide; este, equivalente à metade do standard, é o formato que a Folha usa em alguns especiais e suplementos publicitários. A opção do rival é o chamado berliner, que tem a página menor, mas mantém as proporções do jornal convencional. É um passo dado há tempos por diários na Europa e nos EUA, um jeito elegante de cortar papel e custos.

O jornal ficou leve. "Pela primeira vez está mais leve e mais claro que a Folha. É algo notável", diz Marcio Freitas, responsável pela direção de arte nas últimas reformas gráficas da Folha no site e no impresso. "Está confortável de ler, mas essa leveza tira a sobriedade da notícia, o que é muito curioso em se tratando de um diário que sempre foi mais sisudo."

Ilustração Carvall para coluna Ombudsman publicada no dia 24 de outubro de 2021. nela o desenho de um celular sobre o jornal. A tela do celular  é o jornal impresso.
Carvall

Márcio fala do aspecto visual, mas sua sentença cabe como uma luva na edição de quinta (21), quando os impressos tinham a obrigação de fazer o registro histórico do relatório final da CPI da Covid. O Estado apresentou uma página e meia de texto, ou algo equivalente a uma página standard. A Folha trouxe seis vezes isso, incluindo um grande infográfico. Uma inversão e tanto para uma geração que se lembra de um Estadão pesado, quando ele fazia jus ao nome, com classificados gigantes e vários cadernos.

Faz sentido investir em um produto que no mundo todo definha diante de uma mídia eletrônica cada vez mais pulverizada, que espirra notícias em telas de celulares, elevadores e geladeiras? O Estadão diz que sim ao renovar o jornal impresso para seu conjunto mais importante de assinantes. Na Folha, há meses leitoras e leitores buscam o ombudsman para reclamar de assinaturas de impresso descontinuadas em diversas regiões do país --o jornal põe a culpa na pandemia, mas diz que foram impactados apenas 4% do total de assinantes. O contingente ainda está considerável: 55 mil exemplares impressos numa circulação média diária de quase 360 mil, segundo a Secretaria de Redação.

Tudo indica que seja uma corrida de cisnes, disputando quem solta o mais belo canto antes de perecer, mas há quem ainda insista em nadar contra a corrente.

O exemplo mais recente foi dado pelo britânico The Guardian, que há um mês lançou uma revista semanal, Saturday, com mais de cem páginas e muita coisa para ler, de entrevista de prêmio Nobel a futilidades como playlists de famosos. O primeiro número tinha Greta Thumberg na capa, com um líquido como petróleo escorrendo por sua cabeça.

O jornal já ofertava um semanário impresso, The Guardian Weekly, que traz notícias e artigos selecionados da semana e palavras cruzadas. Sobra papel? Longe disso. A edição diária do Guardian já foi standard, já foi berliner, seu melhor projeto, e há alguns anos, ao terceirizar a impressão para cortar custos, virou tabloide.

Jornal bom é bom em qualquer tamanho ou plataforma.

O som do silêncio

Leitores escrevem ao ombudsman para indagar sobre a saída de Sueli Carneiro do renovado conselho editorial da Folha antes mesmo da primeira reunião do grupo, no começo deste mês. No relato do encontro, publicado em 6 de outubro, um sucinto último parágrafo informa que a escritora, filósofa e ativista antirracismo deixou o conselho no mesmo dia, a pedido.

A pergunta óbvia é se a saída tem a ver com a polêmica em torno da coluna de Leandro Narloch, objeto desta coluna há três semanas. Perguntei se a Secretaria de Redação gostaria de dar mais detalhes do ocorrido. A resposta foi que não haveria nada a acrescentar ao já dito na reportagem, que alterações são comuns e que o conselho, desde sua criação em 1978, já teve 34 formações diferentes; duas modificações no time mais recente.

Como escreveu Andre Degenszajn, do Instituto Ibirapitanga, em artigo no Tendências / Debates, o "silêncio institucional da Folha é posicionamento e produz efeitos".

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