Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Juca Kfouri
Descrição de chapéu Copa do Mundo 2022

O medo da estreia na Copa do Mundo

Há motivos de preocupação com os sérvios, mesmo que eles tenham ainda mais com os brasileiros

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Há 88 anos a seleção brasileira não sabe o que é perder em jogos de estreias em Copas do Mundo.

Perdeu nas duas primeiras, em 1930 e 1934, para, exatamente, a Iugoslávia, na época um reino e depois reunião de repúblicas da qual a Sérvia fez parte, e para Espanha, por 2 a 1 e 3 a 1, respectivamente.

De lá para cá foram mais 19 jogos, com 16 vitórias e três empates: 0 a 0, outra vez com a Iugoslávia, em 1974; 1 a 1 com a Suécia, em 1978, e outro 1 a 1 com a Suíça, na última Copa, na Rússia, e adversária no segundo jogo.

Jogador da Suíça cabeceia a bola em meio a quatro jogadores do Brasil
Zuber marcou o gol da Suíça no empate com o Brasil na estreia de 2018 - Marko Djurica - 17.jun18/Reuters

É lugar-comum ouvir que estreias são sempre complicadas, nervosas, causadoras de um frio diferente na barriga e merecedoras de toda atenção.

A julgar pelas participações brasileiras nas 21 Copas anteriores não é bem assim, embora seja, se a contradição é permitida.

Porque são inúmeras as vitórias por mais de um gol de diferença, para ser mais preciso, oito, a metade delas.

O México é a principal vítima, três vezes derrotado: por 4 a 0, em 1950, 5 a 0, em 1954, e 2 a 0, em 1962.

Austríacos levaram de 3 a 0, em 1958, assim com búlgaros de 2 a 0, em 1966, tchecos de 4 a 1, em 1970, russos de 2 a 0, em 1994, e, finalmente, os croatas, derrotados por 3 a 1, em 2014, em Itaquera.

Veja que, com exceção da austríaca, todas as demais seleções eram de países sob influência soviética, ou seja, até no futebol, os brasileiros gostam de bater nos comunistas e, assim mesmo, tem gente em porta de quartel com medo do perigo vermelho, fundamentalistas com a cabeça feita por falsos pastores, autênticos milicos e desprezíveis comunicadores.

De volta ao futebol, como querem a Fifa e a CBF, embora com discordância cada vez maior dos atletas como os ingleses, iranianos e alemães, foram mesmo duras as estreias vitoriosas contra a Rússia, 2 a 1, em 1982 e Espanha, 1 a 0, em 1986, ambas com erros crassos de arbitragem a favor da amarelinha.

Em 1990 e 1998, o século 20 acabou com dois triunfos suados sobre a Suécia e Escócia, ambos por 2 a 1.

E o novo século começou ainda mais difícil, com três vitórias complicadas: 2 a 1 sobre a Turquia, em 2002, graças a pênalti cometido em Luizão muito fora da área; 1 a 0 na Croácia, em 2006, e 2 a 1 na Coreia do Norte (!), em 2010.

Tudo isso para dizer à rara leitora e ao raro leitor que é sempre assim: quando é feito o sorteio dos grupos, a distância para o início da Copa enseja projeções otimistas, surgem até os que dizem ser obrigação da seleção brasileira se classificar em primeiro lugar.

À medida que o primeiro jogo se aproxima, o discurso muda, a lupa revela o já sabido, que a Sérvia, por exemplo, acabou as eliminatórias invicta, em primeiro lugar, e obrigou o ótimo time de Portugal, em segundo, a disputar repescagem.

Há motivos sim para nos preocuparmos com os sérvios, favoritismos à parte, mesmo que eles tenham ainda mais motivos para se preocupar com os brasileiros.

É verdade que o clima é bom no quartel (epa!) da CBF, que a seleção teve a fortuna de ser poupada de lesões, diferentemente de outros favoritos como França e Argentina, e que, em condições normais de temperatura e pressão, vencer é o mais provável.

Só que tudo que não há no Qatar —muito menos no palco da estreia, o enorme estádio de Lusail, para 80 mil torcedores que brota do deserto como se fosse um OVNI— é condição normal de temperatura.

Em resumo: não será surpresa nem a seleção ganhar o hexa, nem cair fora ainda na fase de grupos.

Erramos: o texto foi alterado

A Iugoslávia era um reino em 1930, não um conjunto de repúblicas, como foi escrito inicialmente. O texto foi atualizado.

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