Juca Kfouri

Jornalista, autor de “Confesso que Perdi”. É formado em ciências sociais pela USP.

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Juca Kfouri
Descrição de chapéu Copa do Mundo 2022

É olhar ainda inicial, mas entre São Paulo e Doha a diferença é o material

Capital do Qatar é uma selva de aço e vidro, sem fronteiras entre a miséria e a riqueza, porque os pobres são excluídos mesmo

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São Paulo é a chamada selva de pedra, insensível, capaz de ter fronteiras entre Paraisópolis e o Morumbi, com explorados e exploradores a dividir o mesmo espaço, um com esgoto a céu aberto, outro com piscinas aquecidas.

E prédios, prédios e mais prédios, como numa competição para ver quem chega mais perto do céu, ou mais longe do inferno de suas calçadas cada vez mais habitadas por gente faminta sem ter onde morar.

Doha é uma selva de aço e vidro, sem fronteiras entre a miséria e a riqueza, porque os pobres, os trabalhadores imigrantes, são excluídos mesmo, condenados a viver na periferia e a rezar para ter seus passaportes devolvidos pelos patrões.

É um absurdo realizar a maior festa do futebol num lugar assim, além do calor proibitivo.

Mas já se fez Olimpíada em Berlim sob o jugo de Hitler, em 1936. Já se fez Copa do Mundo sob a crudelíssima ditadura argentina, em 1978.

Doha é selva de aço e vidro, sem fronteira entre miséria e riqueza - Jung Yeon-je - 17.nov.22/AFP

O Qatar encerra um ciclo ou, tomara, encerrerá um ciclo: África do Sul, Brasil, Rússia e Qatar têm em comum pouco ou nenhum controle social, além de democracias frágeis, casos de África e Brasil, apesar de resistentes como se vê; e as sedes de 2018 e deste ano estão tão longe de regimes democráticos como a distância entre a Terra e a Lua.

Doha não abraça, como Barcelona, Roma, San Francisco, Paris, Berlim, Cidade do Cabo e São Petersburgo, para citar algumas cidades que receberam jogos de Copas.

A capital do Qatar só quer impressionar o forasteiro, mostrar como em menos de 50 anos se ergue uma cidade no meio do deserto —imponente, impressionante sem dúvida, exibicionista, ostentatória a ponto de ser brega.

Tirante as inúmeras restrições por motivos religiosos, Doha parece ser o gênero ideal de cidade para tipos assim como João Agripino Doria —higienizado, com relógio de ouro, pulseira de ouro, gargantilha de ouro.

Doha queria a Copa para se mostrar e, embora ela nem tenha começado, agora torce para que acabe logo, porque esse bando de estranhos que chegou não orna com a cidade que se vê permanentemente no espelho. Doha não vê a hora de essa gente ir embora.

E O FUTEBOL?

O futebol começa neste domingo (22), com os donos da casa recebendo o Equador, jogo incapaz de fazer quaisquer corações baterem mais forte, exceção feita aos dos litigantes.

Há no ar do deserto um certo otimismo pelo entrosamento da equipe local e por ela ter endurecido jogos contra Canadá, para quem perdeu por 2 a 0, Chile, com quem empatou por 2 a 2, gols andinos de Arturo Vidal e Alexis Sánchez. Depois ganhou da Guatemala e de Honduras, 2 a 0 e 1 a 0, o que não chega a ser nenhuma vantagem, embora seja sempre bom lembrar que os hondurenhos derrotaram e eliminaram a seleção brasileira por 2 a 0, nas quartas de final da Copa América de 2001, meses antes do pentacampeonato.

Então, antes de a zebra se consumar, e consumir boa parte da confiança que a torcida depositava em Felipão, houve jornalista que prometeu virar chefe de cozinha caso os brasileiros fossem derrotados. No dia seguinte à promessa ganhou de companheiro, que dividia programa com ele, um chapéu de mestre-cuca (não confundir com o ex-treinador do Atlético Mineiro, por favor!).

Para sorte dos paladares paulistanos, a promessa não foi cumprida, nem o chapéu algum dia frequentou sua cabeça que insiste em dar palpites.

O Equador vencerá.

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